domingo, 31 de outubro de 2010

ELEGEMOS UMA MULHER PARA A PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA! E AGORA?

31 de Outubro de 2010. Primeira década do Século XXI. Vinte e uma horas e cinquenta e sete minutos. O Brasil, esse país imenso, continental, confrontado com desafios com o tamanho e complexidade de sua própria dimensão, eleje uma mulher para presidir a República. 

Com cerca de 98% das urnas apuradas, a candidata Dilma Roussef  já desponta como Presidente eleita, com cerca de 55% dos votos (por enquanto. Pode ainda chegar a 56%, segundo os comentaristas). 

Trata-se da primeira mulher a ser eleita para semelhante cargo, numa eleição em que duas o desputaram. Trata-se de uma mulher que vem suceder o Presidente Operário, o único em toda a história humana, a chegar a bom termo em sua gestão e, ainda, ao fim de seu segundo mandato,  poder contar com a extraordinária popularidade que ostenta. 

Mas, além disso, o que significa isso?

Primeiro que tudo, significa que certamente as cobranças sobre seus ombros serão ainda maiores sobretudo no que diz respeito à violência de gênero - dados do Conselho Nacional de Justiça apontam que DEZ  mulheres são assassinadas A CADA DIA no Brasil, em razão do machismo.Entre 1997 e 2007, foram assassinadas QUARENTA E UM MIL, QUINHENTOS E TRINTA E DUAS MULHERES (41.532) pelo mesmo "motivo". - Tema que jamais vi entrar na pauta de discussões do Vaticano, das Igrejas evangélicas ou mesmo da CNBB (para além de mera campanha da fraternidade), assim como igualmente não vi entrar o tema da má distribuição de renda, da concentração de terras e assim por diante.

Significa igualmente uma renovação das esperanças no enfrentamento e superação da péssima qualidade da educação e da saúde públicas.

Vem sendo destacado que seu governo, ao contrário das gestões do Presidente Lula, poderá contar com a maioria do Congresso. Porém, é preciso termos clareza sobre com qual Congresso essa mulher exercerá o seu mandato, sem falar dos perfis dos dez partidos que entraram em coalisão para a sua candidatura. 

Como destacado pelos comentaristas do Repórter Brasil, ainda há pouco, é preciso lembrar que este Congresso que saiu das urnas em outubro é um congresso de centro e de direita. A vertente progressista, desgraçadamente, é reduzidíssima.

E é com esse conjunto de parlamentares, portadores de visões de mundo as mais conservadoras, que ela, que sempre teve consciência política mais progressista, terá que governar. 

Aliás, foi justamente pressionada por essas forças as mais retrógradas que ela se viu compelida a se posicionar contraditoriamente em relação à questão do abortamento e do reconhecimento dos direitos dos homossexuais.

Em seu primeiro pronunciamento como Presidente Eleita, Dilma destacou e reafirmou o seu compromisso com a democracia, a república, a liberdade de imprensa (o que não significa de forma nenhuma ausência completa de regulamentação e de observência da Constituição) e, sobretudo, com o respeito aos direitos de todas as minorias. Afirmou, ainda, que prestigiará a meritocracia, a transparência e que não hesitará na apuração de denúncias de irregularidades, caia sobre quem recair; que não acobertará aliados ou amigos, se sobre estes pairarem dúvidas quanto a sua lisura no exercício da gestão da coisa pública.

Aguardemos. Atentos, contudo.

Penso que todos os brasileiros que sobre ela renovaram suas esperanças se irmanam nesse momento, confiantes sobretudo no Brasil, em seu futuro mais inclusivo, mais fraterno e com um povo mais escolarizado, dotado de maior nível sóciocultural. Nada será fácil, porém. 

À população LGBT, notadamente aquela que ajudou a construir o PT e ao longo de todas essas quase três décadas dedicou suas energias ao crescimento e consolidação de um partido que acreditava representar os melhores anseios do povo, seja do trabalhador, pobre, sejam das minorias políticas - mulheres, negros, homossexuais -, cabe exercer o seu papel de cobrança.

De cobrança do estrito cumprimento da Constituição da República. Da efetivação de seus princípios normativos; aqueles que - já se encontra pacificado o entendimento - são normas obrigatórias e válidas (exigíveis) desde sua entrada em vigência, há 22 anos atrás.
Aos dirigentes dos movimentos LGBTs cabe ter clareza de seu papel histórico e não se deixar seduzir com cargos e funções gratificadas; com dotações de verbas pontuais, tendentes mais à cooptação do que à efetiva superação de nossa trágica realidade de assassinatos, espancamentos, humilhações diárias, negativas de direitos.

E conduzir o processo de conscientização, a sua luta, com o mais absoluto respeito às regras de todo processo democrático; focados indissociavelmente nos objetivos de sua luta política - o reconhecimento dos direitos, a promoção da equidade, da isonomia, da superação da estigmatização -, sem porém descuidar um milímetro sequer dos princípios e valores que devem nortear todas as nossas ações, públicas ou privadas.

Enfim, que possamos todos nós, brasileiros, homens, mulheres, travestis, transexuais, gays, lésbicas, vivenciar cada qual o nosso cotidiano, os gestos mais triviais de nossos dias, sempre de forma a contribuir para a concretização de nossos valores de dignidade, liberdade, fraternidade, isonomia de oportunidades, justiça social. De modo a vermos se materializar os versos de Milton Nascimento e Fernando Brant na canção "notícias do Brasil" e fazermos desse lugar um bom país, pois, afinal, "aqui vive um povo que merece mais respeito".

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