sábado, 26 de setembro de 2009

"É PRECISO TER RESPEITO AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE”

Abre a primavera um sábado frio, úmido, cheio de vento e, até as nove, nublado - tudo que o povo do Rio não gosta. Após um café da manhã tranquilo, dou início a atualização dos acontecimentos, via internet.

A primeira notícia já de cara azeda o dia de uma primavera atípica. - Mais uma atitude discriminatória, mais um ato de indignidade contra expressões de afeto entre pessoas de mesmo sexo.

Tão sintomático do nível de enfermidade de uma sociedade, as frequentes demonstrações de desconforto e preconceito diante de qualquer gesto de ternura, de afetividade entre pessoas do mesmo sexo - principalmente se praticado entre homens - dão bem o relevo das bases violentas e opressivas que disputam a estruturação do convívio humano.

- O afeto, a amizade fraterna, cuidadosa e meiga, o amor, ao invés de sentimentos a serem estimulados e amparados socialmente para que vicejem, são, ao contrário, banidos, desqualificados, alvo de segregação.

Quem os manifeste publicamente sofre o cerceamento às liberdades individuais, agressões à dignidade pessoal e, mesmo, agressões à integridade física via brutais espancamentos e, pasme, a morte!

Certas religiões que se dizem cristãs, elegem como objetivo principal, não uma acirrada campanha contra a corrupção, a malversação do dinheiro público, o uso particular, privado, da coisa pública, a violência, o desamparo da infância e da velhice, a insuficiência na qualidade do ensino público, ou mesmo a precariedade da saúde pública. Não, nada disso é capaz de mobilizar-lhes a energia e o seu aparato logístico e humano. Nada disso lhes é importante, capaz de merecer-lhes atenção, ações interventivas. Para essa gente, a única questão realmente relevante, transcendente, fundamental aos destinos pátrios, é matar toda possibilidade de afeto, de amor entre pessoas de sexo igual.

Essa parcela da sociedade brasileira vive a dizer diariamente: - É preciso matar o amor! Morte à ternura! Abaixo o afeto! O compromisso e cuidado mútuos!

Ao mesmo tempo, silencia quanto ao também cotidiano abuso sexual de crianças e mulheres, tráfico de mulheres, violência contra filhos e esposas; à concentração de renda, injustiça social, desemprego, degradação do emprego, fome.

Mas essas vozes, para quem o amor é condicional e as normas constitucionais não são absolutas, não representam a maioria da nossa população. Embora façam tudo para parecerem.

Há muita gente neste país que acredita no amor, na fraternidade, na solidariedade, no cuidado recíproco, na importância de vínculos familiares - seja lá de que sexo for.

Há muita gente neste país que acredita e defende os preceitos constitucionais: Os direitos humanos universais, isto é, o princípio inviolável da dignidade humana; o Brasil como um país efetivamente fraterno, laico, respeitoso e feliz.

E luta diariamente para que tais valores sejam respeitados.

Leia, a seguir, as matérias noticiando a agressão praticada em Brasília e a dignificante atitude dos rapazes agredidos.

Cada vez mais me convenço de que a responsabilização civil pelo dano moral praticado é a via estratégica mais adequada, na busca de ações transformadoras eficazes. Seu conteúdo pedagógico é elevado, comparativamente às vias criminais, pelo que temos visto de capacidade de sabotamento e impunidade em nosso país.

O sol está esplendoroso agora. O céu, espetacularmente azul. - É preciso que eu corrija aquela minha frase lá de cima: Nada há de estragar o nosso sábado, nem a alegria de nossas vidas!

Acima de tudo, acreditamos que tornar este país respeitoso e fraterno é possível. E, cada um à sua maneira, tentamos fazer de todos os nossos dias um exemplo de coerência com esta crença e construção - por mais que, às vezes, pareça tão difícil e desestimulante.

Parabens aos jovens de Brasília. Parabens às instituições que lhes deram e estão dando apoio. Parabens ao Delegado. Parabens ao representante da Comissão de Direitos Humanos OAB/DF. - Gente assim nos enche de orgulho!


Após trocar uma carícia no rosto, dois amigos homossexuais são convidados, pelo dono do bar onde estavam, a se comportar de "maneira adequada". O caso para na delegacia

Naira Trindade

Publicação: 26/09/2009 08:15 Atualização: 26/09/2009 08:44

http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2009/09/26/cidades,i=144526/BEIJO+ENTRE+HOMOSSEXUAIS+VIRA+CASO+DE+POLICIA+NA+ASA+SUL.shtml

Cinco amigos atores — todos homossexuais — sentaram-se a uma mesa de bar. Um beijou a face do outro como demonstração de carinho. A atitude causou irritação no proprietário do estabelecimento, que pediu que os jovens se “comportassem” enquanto permanecessem no local. A intimidação constrangeu os rapazes e eles se retiraram do espaço. A noite que deveria ser de diversão terminou na 1ª Delegacia de Polícia (Asa Sul), com o registro de uma ocorrência sobre ofensa ao direito à personalidade, garantido pela Constituição Federal.

As vítimas não formam um casal homoafetivo. Jonathan Andrade, 27 anos, e Eduardo Dutra, 25, são amigos. Na última quarta-feira, eles escolheram o Bar Leblon, na 208 Sul, para uma conversa regada a chope. Chegaram às 23h e pediram as bebidas. Antes mesmo que elas fossem servidas, Eduardo abraçou o amigo Jonathan e afirma ter lhe dado um beijo no rosto. Em menos de 10 minutos de permanência do grupo no bar, o gerente José Geraldo Vieira aproximou-se educadamente e pediu que os dois não se abraçassem ou se beijassem enquanto estivessem no local.

A repressão causou indignação nos jovens. Eles se levantaram e acompanharam o gerente que se retirava após passar a mensagem. Queriam saber qual era o problema em manifestar afetividade em um espaço aberto ao público, como um bar. “Dava para perceber o constrangimento do gerente ao fazer o pedido. Parecia uma recomendação do superior dele”, observa Dutra. Durante a conversa, Pedro Diniz, 27, um dos três proprietários do estabelecimento, apareceu e convidou os jovens a continuar aquela conversa na calçada do lado de fora do bar, distante das mesas de clientes que assistiam a um jogo de futebol e ouviam música alta.

“Fomos levados para fora do local e lá o proprietário disse que não queria esse tipo de atitude (beijo entre pessoas de mesmo sexo) no bar dele, como se estivéssemos fazendo algo errado”, revolta-se Eduardo, que tem uma relação estável com um homem há cinco anos. Nem Jonathan nem Eduardo sentem vergonha em assumir a homossexualidade. O imbróglio envolvendo o grupo de amigos teria se iniciado na sexta-feira, dia 18, quando eles comemoravam um aniversário no mesmo bar. “Naquela noite, um dos nossos amigos deu um ‘selinho’ no namorado”, lembra Jonathan. Os jovens acreditam que o dono do bar lembrou-se do episódio e quis evitar que se repetisse.

Defesa
A versão é confirmada por Pedro Diniz, que alega que beijos excessivos — tanto entre heterossexuais quanto homossexuais — são reprimidos. “Se fosse um casal de heteros desrespeitando os outros clientes, a gente também pediria para parar. Nosso público é familiar.” Diniz garante que não expulsou o grupo: “Só pedi que eles se comportassem de maneira adequada. Não posso perder 10 mesas por causa de uma”.

A aversão a homossexuais — conhecida como homofobia — não é considerada crime no Brasil. No entanto, a discriminação contra raça, sexo ou gênero é crime de ofensa aos direitos da personalidade. “Todo e qualquer ato discriminatório deve ser terminantemente proibido. Se a atitude não foi nada que atentasse ao pudor de quem estava no local, ninguém tem o direito de recriminar. Eles são seres humanos e merecem respeito”, explica o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Jomar Alves Moreno. “A atitude cabe ação cível com direito a danos morais. Separar o local como ambiente familiar é outro erro. Homossexuais podem constituir uma família e adotar filhos”, completa.

Professora da Universidade de Brasília e doutoranda sobre relações homossexuais, Suzana Viegas complementa que existe uma proteção sobre a orientação sexual das pessoas. “O artigo 3º, inciso 4º da Constituição protege todas as pessoas de qualquer forma de discriminação, seja ela gorda, magra, negra, branca, hetero ou homossexual. E o fato de eles não formarem um casal só mostra que a ação foi arbitrária. É preciso ter respeito ao princípio da dignidade.”

O Núcleo de Atenção à Diversidade e Enfrentamento à Discriminação Etnorracial, Sexual e Religiosa (Nudim), da Secretaria Especial de Direitos Humanos do DF, acompanha há cinco meses episódios de preconceito na capital. “O órgão é novo e ainda não fizemos um levantamento da quantidade dos casos, mas estamos acompanhando e vamos verificar essa caso”, explica a chefe do núcleo, Carol Silvério.


PROJETO DE LEI
O artigo 2º do Projeto de Lei Federal 5003, de 2001, altera uma lei de 1989 que define como crime preconceitos de raça, cor ou sexo. No projeto, fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, orientação sexual e identidade de gênero, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas as hipóteses de proteção ao menor. O projeto prevê punição de dois a cinco anos de reclusão para quem discriminar outra pessoa pelas razões citadas. Àquele que impedir ou recusar o ingresso ou permanência em qualquer ambiente ou estabelecimento público ou privado, aberto ao público, a pena será de um a três anos de prisão. No entanto, o projeto tramita no Senado, sem previsão para ser votado.


TELEFONES
Denúncias de discriminação sexual podem ser feitas para o Núcleo de Atenção à Diversidade e Enfrentamento à Discriminação Etnorracial, Sexual e Religiosa (Nudim) pelos telefones 0800 647 1407, 3322-9368 ou 3224-4898.

Para saber mais

Beijaço para protestar

O corte da cena de um beijo entre atores de mesmo sexo na novela América, da Rede Globo, em 2005, gerou comoção nacional. Várias cidades do país promoveram um beijaço como forma de protestar contra o preconceito. A ação se repetiu em Brasília, quando um casal de homossexuais sofreu represálias ao se beijar à beira das piscinas da Água Mineral. Anos antes, em outubro de 2003, dezenas de brasilienses se reuniram no Bar Beirute, na Asa Sul, para se manifestar contra garçons que constantemente pediam aos casais de homens ou de mulheres que parassem de se beijar. Os funcionários argumentavam que o ato desrespeitava o local."
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2009/09/26/cidades,i=144526/BEIJO+ENTRE+HOMOSSEXUAIS+VIRA+CASO+DE+POLICIA+NA+ASA+SUL.shtml



Mão na perna e beijo em
bar viram caso de homofobi
a

http://www.paroutudo.com/materias/redacao/090925.php

Publicado em 25.09.2009 Welton Trindade

Na madrugada da quinta-feira 24, os amigos Eduardo Dutra, 24 anos, ator, e Jonathan Andrade, 27 anos, ator e professor, estavam em um local e em um clima bem diferente daquele que imaginaram ao se reunir horas antes com outros dois conhecidos no Botequim Leblon, que fica na comercial da 208 Sul. O que era para ser um simples encontro de amigos se transformou em caso de polícia por conta da homofobia. Um caso que tem aparecido em muitos e-mails de LGBTs do DF encaminhados por gente revoltada com o episódio.

"Chegamos ao bar, nos cumprimentamos e fizemos o nosso pedido. Logo depois, o gerente do local se aproxima e diz para que ficássemos comedidos. Isso porque dei uma abraço, ou no máximo, um beijo no rosto do meu amigo", relata Dutra. A confusão foi tanta que o grupo foi para a calçada do local tentando obter explicações do gerente. Foi quando o dono do bar apareceu. "Segundo o proprietário, o bar não era local para esse tipo de coisa. Que já tínhamos o prejudicado muito na sexta-feira anterior, quando um dos meus amigos e um outro grupo tinham ido lá. E tudo isso de forma bem grosseira", explica. "Realmente, na sexta-feira, um amigo meu deu um selinho no namorado, que era aniversariante, mas foi isso, um selinho", afirma o ator.

Indignado com o tratamento, o grupo, orientado por uma advogada conhecida por um deles, foi à 1° Delegacia de Polícia fazer o boletim de ocorrência. Entretanto, o nervosismo continuava. "Tínhamos muito receio de irmos a uma delegacia. Medo de sermos discriminados de novo, mas o que aconteceu foi o contrário. O delegado foi super compreensivo e até lamentou o fato de não haver uma lei no Brasil que punia a homofobia, mas nos explicou os outros crimes que podem ser aplicados no caso, tais como danos morais e desrespeito às leis em defesa do consumidor", diz Dutra.

Agora, Dutra e Andrade estão recebendo assistência do Núcleo Jurídico do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb) e registraram o caso também no Núcleo de Atenção à Diversidade e Intolerãncia Sexual, Religiosa e Racial, da Secretaria de Estado de Assistência Social e Transferência de Renda. Eles foram orientados pelo serviço Casa Roxa, da ONG Coturno de Vênus.

Dutra diz que está preparado para prosseguir com o caso na Justiça. "Que o que ocorreu com a gente sirva de exemplo para que não aceitemos a discriminação. E vamos mostrar que quem discrimina comete um crime ao fazer isso."

: : O outro lado

Geraldo Vieira, gerente do Bar Leblon, confirma que houve o pedido para que o grupo se "controlasse". "Eles se beijaram na boca e um estava com a mão na perna do outro. Cheguei e falei para eles que o estabelecimento era familiar e que o comportamento deles não era adequado. Que eles poderiam continuar na mesa, mas com essa condição." Vieira afirma que esse procedimento é comum no bar. "Dias antes, um casal de homem e mulher estavam em um amasso numa mesa no fundo. Fui lá e os adverti. A regra vale para todos."

A respeito do episódio da sexta-feira anterior ao dia do ocorrido, o gerente confirma-o e dá mais detalhes. "Esse grupo tinha vindo dias antes e feito o mesmo. Até tinha um major da Polícia Militar aqui, amigo do dono, que diz que tinha gostado do bar, mas que a clientela era diferente da que ele tinha imaginado. Ele pediu a conta e foi embora. E outras duas mesas fizeram isso também."

Perguntado se a atitude dele e do dono do bar foi discriminatória, a resposta é negativa. "Não foi discriminação. Eles poderiam ficar no bar, mas só que sem chamar a atenção e respeitando os outros clientes"."
http://www.paroutudo.com/materias/redacao/090925.php

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