A separação entre Estado e Igreja (no caso, a Católica) se deu com a instauração do regime republicano. Deu-se de direito, porque de fato até o presente é algo que ainda está por ser conquistado.
Funcionando como se fora um dos poderes do Estado Imperial, o clero católico não abriria mão, de forma cordata, sem resistir, de sua enorme influência sobre os assuntos de Estado e da Sociedade, exercida há séculos no mundo ocidental.
O fato é que, embora com mais de cento e vinte anos de existência, a República Brasileira não conseguiu dar efetividade ao princípio da separação entre a esfera religiosa e a civil.
Por toda a parte se vê o quanto a religião ainda impregna a vida do Estado: em diversas repartições públicas encontram-se crucifixos; hospitais públicos ostentam capelas católicas ao invés de espaços ecumênicos; a Constituição da República traz em seu preâmbulo que os congressistas se reuniram para elaborá-la e a promulgaram "sob a proteção de Deus"; as cédulas de dinheiro ostentam a expressão "Deus seja louvado"... Ritos cívicos e políticos são precedidos por rituais religiosos, como se daqueles fossem parte integrante.
O exemplo mais recente e eloquente foi a posse da Presidenta Dilma Roussef que, antes da cerimônia no Congresso, compareceu ao Templo Católico. Na cerimônia da Posse, no Congresso, podia-se ver na parede ao alto da Mesa do Plenário, pender um crucifixo, enquanto que ao brasão da República restava um lugar embaixo da mesa. Por diversas vezes a Presidenta Eleita, em seu discurso, empregou o nome da divindade.
E o que dizer da disputa bizarra, verificada nessas últimas eleições, onde se assistiu ao deprimente espetáculo protagonizado pelos candidatos à presidência com maiores chances de vitória - a atual Presidenta e o Senhor José Serra - conduzindo o pleito como uma grande cruzada para se mostrar mais religioso do que o outro/a e, assim, conquistar mais votos da parcela crente da população?
Tais gestos não foram práticas isoladas de Dilma ou Serra. Já vem de antes. Tambem o ex-Presidente Lula foi pródigo no emprego do nome do Deus. Na anterior eleição para o Senado, a marca da campanha do senador Dornelles foi uma guerra santa contra a candidata Jandira Feghali.
Por toda a parte se vê o quanto a religião ainda impregna a vida do Estado: em diversas repartições públicas encontram-se crucifixos; hospitais públicos ostentam capelas católicas ao invés de espaços ecumênicos; a Constituição da República traz em seu preâmbulo que os congressistas se reuniram para elaborá-la e a promulgaram "sob a proteção de Deus"; as cédulas de dinheiro ostentam a expressão "Deus seja louvado"... Ritos cívicos e políticos são precedidos por rituais religiosos, como se daqueles fossem parte integrante.
O exemplo mais recente e eloquente foi a posse da Presidenta Dilma Roussef que, antes da cerimônia no Congresso, compareceu ao Templo Católico. Na cerimônia da Posse, no Congresso, podia-se ver na parede ao alto da Mesa do Plenário, pender um crucifixo, enquanto que ao brasão da República restava um lugar embaixo da mesa. Por diversas vezes a Presidenta Eleita, em seu discurso, empregou o nome da divindade.
E o que dizer da disputa bizarra, verificada nessas últimas eleições, onde se assistiu ao deprimente espetáculo protagonizado pelos candidatos à presidência com maiores chances de vitória - a atual Presidenta e o Senhor José Serra - conduzindo o pleito como uma grande cruzada para se mostrar mais religioso do que o outro/a e, assim, conquistar mais votos da parcela crente da população?
Tais gestos não foram práticas isoladas de Dilma ou Serra. Já vem de antes. Tambem o ex-Presidente Lula foi pródigo no emprego do nome do Deus. Na anterior eleição para o Senado, a marca da campanha do senador Dornelles foi uma guerra santa contra a candidata Jandira Feghali.
Esse grave comprometimento da autonomia cívica pela crescente dominância da religiosidade não se dá apenas através das forças católicas mais reacionárias e conservadoras. As chamadas religiões neopetencostais vem obtendo a cada dia mais espaço e poder em todas as áreas da sociedade.
Seu avanço se dá a partir de fins dos anos 80 do século passado, em um contexto marcado por agudos índices de desemprego e inflação. Desacreditadas da capacidade do Estado e da sociedade civil organizada em dar solução às suas angústias e incertezas, resta à parcela mais vulnerável socioeconomicamente investir toda incerteza, insegurança e desamparo na esfera religiosa, certas de que, somente dessa forma, serão salvas.
Fragilizadas, sem políticas públicas de proteção social com que contar para fazer frente aos efeitos das sucessivas crises econômicas decorrentes não apenas dos equivocados modelos de gestão praticados por diversos governantes e das pressões de nossa elite predatória e individualista, mas igualmente da hegemonização das doutrinas neoliberais, não foi difícil o campo religioso avançar sobre as grandes massas da sociedade e delas obter os recursos necessários aos seus projetos políticos.
O projeto de poder que permeia tais disputas é claramente visível. Dele fazem parte tanto a realização de eventos de massa em contraponto a eventos do mundo laico - carnaval, espetáculos de rock, parada gay etc. - quanto a ocupação de territórios tradicionalmente mundanos.
Obedecendo a uma lógica de conquista, passamos a ver proliferarem com assustadora velocidade o número de templos religiosos, preferencialmente instalados em espaços tidos como ícones da vida carnal - boates, cinemas, bares etc. Mas o projeto político de tais grupos não para por aí.
Não basta a conquista do rebanho. É preciso sobretudo conquistar o Estado!
Não basta a conquista do rebanho. É preciso sobretudo conquistar o Estado!
O contexto que no plano econômico desagrega, vulnerabiliza, no cultural encontra-se marcado por grandes transformações tanto tecnológicas quanto institucionais. Valores, modelos e paradigmas passam por fortes modificações. Cada vez é maior a sensação de insegurança e incerteza que gerações inteiras têm que aprender a lidar, formadas que foram na ilusão de que podiam controlar e conduzir com relativa tranquilidade sua trajetória de vida.
Os espíritos desamparados, atomizados, coisificados, afundam em depressões e compulsões. O Soma assume múltiplas formas - drogas lícitas e ilícitas, consumismo, corpolatria, violência, fanatismo religioso.
Desiludidos da vida civil, vastos contingentes voltam-se para o transcedental. Nesse ambiente, o discurso religioso caracteriza-se por forte apelo ao ideário conservador e reacionário. Encontra terras vastas e férteis. As religiões passam a apresentar cada vez maior número de candidatos aos cargos de representação política. A cada pleito, amplia-se o tamanho das chamadas bancadas evangélicas.
Desiludidos da vida civil, vastos contingentes voltam-se para o transcedental. Nesse ambiente, o discurso religioso caracteriza-se por forte apelo ao ideário conservador e reacionário. Encontra terras vastas e férteis. As religiões passam a apresentar cada vez maior número de candidatos aos cargos de representação política. A cada pleito, amplia-se o tamanho das chamadas bancadas evangélicas.
Os assuntos da esfera civil da sociedade, anteriormente debatidos no âmbito dos campos intelectuais/científicos/artísticos (medicina, direito, psicologia, ciência política, antropoligia, teatro, música, composição, literatura etc), passam a ser pautados pela visão religiosa.
Não é mais o ideário iluminista que governa nossa sociedade. No debate dos grandes temas nacionais, retornamos aos marcos medievais. Ao invés de cientistas sociais, juristas, agora são os pastores os convocados a proferir o discurso de verdade.
Enquanto isso, o ensino público é sucateado; a remuneração do professor, aviltada.
A formação que se busca não é de cidadãos críticos, cônscios, capazes de conduzir os destinos de um país continental vasto em recursos estratégicos. Não. O objetivo é tão somente a constituição de mão de obra para o mercado. Os betas e ípsilons necessários à manutenção do status quo - a ignominiosa concentração de renda, a imoral taxa de exploração -, como no Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley.
A formação que se busca não é de cidadãos críticos, cônscios, capazes de conduzir os destinos de um país continental vasto em recursos estratégicos. Não. O objetivo é tão somente a constituição de mão de obra para o mercado. Os betas e ípsilons necessários à manutenção do status quo - a ignominiosa concentração de renda, a imoral taxa de exploração -, como no Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley.
Os movimentos sociais, anteriormente indutores da transformação coletiva, hoje são constituídos por associações empresariais que, em busca de poder, prestígio e recursos, tudo o que não deseja é a constituição de uma base social ampla, autônoma, crítica, independente. A sua lógica é estruturada numa prestação de serviços livre a um tempo das obrigações do servidor público e da exigibilidade de um direito por parte do cidadão transformado em cliente/público-alvo.
Em meio a um tal cenário, com que tintas e cerdas compor uma nova paisagem, no sentido da concretização dos objetivos fundamentais de nossa República Federativa, fixados em nossa Constituição de 1988?:
"Construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação"
Como atuar, desde o trivial cotidiano, no esforço da efetivação das diretrizes nacionais reunidas no preâmbulo de nossa Carta Magna?:
"Um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias."
De meu ponto de vista, ademais de buscar em cada gesto cotidiano a expressão da convicção nos valores republicanos, democráticos, fraternos, cooperativos, pluralista, a grande batalha deve ser mesmo pela educação - no sentido da formação de cidadãos conscientes, críticos, capazes de realizar e se responsabilizar pelas suas escolhas; comprometidos com o projeto de país afirmado em nossa Constituição.
- Faça deste um ano realmente Novo!
Referências:
As imagens utilizadas foram extraídas respectivamente, de
coisasdeacreditar.blogspot.com
andreafreitas.wordpress.com
Um comentário:
Lacan fala sobre o futuro da religião, em um de seus livros. Ele é meio pessimista, acredita que, em meio a essa visão desamparada e fragmentada da realidade, o homem pode se voltar para o transcedental, para aquilo que é imutável, fixo, e que, portanto, gera segurança e menos sofrimento. É lamentável, mas parece ser esse o nosso futuro.
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