ABGLT vai ao STF com Mandado de Injunção que visa o reconhecimento do dever
constitucional do Congresso Nacional criminalizar a homofobia e a transfobia
(mandado de injunção nº 4733)
http://www.abglt.org.br/port/basecoluna.php?cod=228
A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e
Transexuais (ABGLT) é uma entidade de abrangência nacional, fundada em 1995, que
atualmente congrega 257 organizações congêneres e tem como objetivo a defesa e
promoção da cidadania desses segmentos da população. A ABGLT também é atuante
internacionalmente e tem status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social
da Organização das Nações Unidas. A missão da ABGLT é promover ações em prol da
cidadania e os direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e
transexuais (LGBT), contribuindo para a construção de uma sociedade democrática,
na qual nenhuma pessoa seja submetida a quaisquer formas de discriminação,
coerção e violência, em razão de suas orientações sexuais e identidades de
gênero.
A ABGLT propôs mandado de injunção perante o Supremo Tribunal Federal, no
qual pleiteia o reconhecimento do dever constitucional do Congresso Nacional em
criminalizar a homofobia e a transfobia.
Passamos, assim, a explicar os motivos que justificaram a propositura da
presente ação – sendo que todas as explicações técnico-jurídicas sobre as teses
que a fundamentam e sobre a necessidade da criminalização aqui pretendida são
explicadas pelo advogado constitucionalista Paulo Iotti, que assina a ação em
nome da ABGLT, em artigo constante do seguinte link: (que traz, no seu segundo parágrafo, link que leva à íntegra da petição
inicial – e quem pretender nos criticar tem o dever ético de, no mínimo, ler a
íntegra da ação para entender suas teses).
A violência e a discriminação contra pessoas LGBT em geral está
aumentando absurdamente ano após ano. Os relatórios anuais do GGB – Grupo Gay da
Bahia mostram que o índice de assassinatos cometidos por homofobia (crimes de
ódio homofóbico) está em linha ascendente. A criminalização da homofobia e da
transfobia, assim, mostra-se absolutamente
necessária.
Contudo, o Congresso Nacional está assolado por uma bancada que, ao
colocar suas convicções religiosas-fundamentalistas acima da Constituição (que
consagra um Estado Laico, que não pode ser influenciado por motivações
religiosas), opõe-se ferozmente tanto ao reconhecimento de direitos civis
básicos à população LGBT quanto à criminalização da homofobia e da transfobia.
Sequer reconhecer direitos previdenciários ou a entidade familiar formada por
casais homoafetivos, o que é uma decorrência lógica da histórica decisão do STF
de 05 de Maio de 2011 (ADPF 132 e ADI 4277), o Congresso Nacional tem se
mostrado propenso a fazer – ao contrário, há projetos que pretendem “derrubar”
ganhos conseguidos na via judicial...
Assim, essa situação de elevadíssima violência, ofensas e discriminações
contra pessoas LGBT, que Paulo Iotti chama (parafraseando Hannah Arendt) de
banalidade do mal homofóbico, demonstra que temos direitos
fundamentais das pessoas LGBT já consagrados na Constituição e que demandam
proteção pelo Supremo Tribunal Federal. Os direitos fundamentais à livre
orientação sexual e à livre identidade de gênero, bem como o direito fundamental
à segurança (art. 5º, caput) e à tolerância (art. 3º, inc. IV) da
população LGBT estão inviabilizados nos dias de hoje, já que as pessoas
LGBT estão com medo de serem reconhecidas como tais por medo de
serem agredidas, ofendidas e/ou discriminadas por sua mera orientação sexual ou
identidade de gênero (pessoas LGBT têm medo de andarem na Avenida Paulista, a
avenida mais cosmopolita da mais cosmopolita de nossas capitais). Aliás, até
mesmo heterossexuais estão sofrendo os efeitos nefastos da homofobia – basta
lembrar do caso de pai e filho que foram agredidos no ano passado e o pai perdeu
parte da orelha porque foram confundidos com um casal homoafetivo pelo simples
fato de estarem abraçados... esse é o nível absurdo a que chega a homofobia
hoje: basta estar abraçado com outro homem que isto é visto por homofóbicos como
algo “inadmissível” e “passível” de
agressões...
Por outro lado, como explicado na ação com base na lição de Luiz Carlos
dos Santos Gonçalves (atual relator da Comissão de Juristas responsável pela
elaboração de anteprojeto para o novo Código Penal), a criminalização de
condutas, quando constitucionalmente obrigatória, torna-se pressuposto da
cidadania, e o dispositivo constitucional relativo ao mandado de injunção diz
que ele será concedido quando a ausência de norma regulamentadora (no caso, da
punição criminal à homofobia e à transfobia) torne inviável o exercício de
direitos ou liberdades constitucionais ou, ainda, de pressupostos inerentes à
cidadania. Logo, plenamente cabível o mandado de
injunção.
Como dito, o artigo jurídico de Paulo Iotti traz a explicação
técnico-jurídica sobre os fundamentos da ação – que englobam desde o cabimento
do mandado de injunção para criminalização de condutas com base no texto
constitucional, a legitimidade ativa da ABGLT, as ordens constitucionais de
criminalizar condutas que obrigam o Congresso Nacional a criminalizar de forma
específica a homofobia e a transfobia e os pedidos da ação (sua criminalização
como espécies do gênero racismo, entendido pelo STF como toda ideologia que
pregue a inferioridade de um grupo relativamente a outro, como elas fazem com
pessoas LGBT relativamente a heterossexuais que se identificam com seu sexo
biológico, ou no mínimo como discriminações atentatórias a direitos e liberdades
fundamentais; declaração de mora inconstitucional do Congresso em efetivar tal
criminalização – que é o reconhecimento de que ele está atrasado, pois já
deveria tê-la efetivado; fixação de prazo razoável para o Congresso aprovar a
lei de criminalização da homofobia e da transfobia; exercício de função
legislativa atípica pelo STF caso o Congresso não cumpra a decisão do Tribunal
como ele fez quando regulamentou a greve dos servidores públicos civis (MI 670,
708, 712) ou a aposentadoria especial de pessoas com deficiência (MI 721); e,
ainda, reconhecimento da responsabilidade civil do Estado Brasileiro em
indenizar vítimas de homofobia e transfobia enquanto não se efetiva tal
criminalização). Assim, remetemos o leitor ao link acima citado para entender a
síntese das teses que justificam a ação e, ainda, para ter acesso ao link que
leva à íntegra da petição inicial.
Com essa ação, pretendemos primordialmente o reconhecimento, pelo STF, de
que o Congresso Nacional tem o dever constitucional de criminalizar a homofobia
e a transfobia de forma específica, no sentido de que da mesma forma que as
criminalizações genéricas do Código Penal de 1940 não são suficientes para
coibir o racismo contra negros, não o são para coibir o racismo homofóbico e
transfóbico – inclusive em razão de Resoluções Internacionais da ONU
e da OEA, que vêm exigindo medidas específicas para proteção dos LGBT. Ou seja,
a ABGLT espera que o Supremo Tribunal Federal reconheça o dever constitucional
do Congresso Nacional em criminalizar de forma específica a homofobia e a
transfobia. Se o STF julgar o mérito da ação, entendemos que a procedência desse
pedido é inquestionável. Embora também acreditemos na sua procedência,
reconhecemos que os demais pedidos provavelmente gerarão polêmica na comunidade
jurídica, mas este primeiro nos parece inquestionavelmente
procedente.
É importante destacar que a ABGLT não considera que o STF seja a panaceia
para todos os males. Acreditamos nos fundamentos constitucionais apresentados
por Paulo Iotti na referida ação e, portanto, acreditamos que a nossa
Constituição Cidadã de 1988 demanda pela proteção penal das cidadãs e dos
cidadãos LGBT, já que a mesma proíbe a proteção deficiente de cidadãs e
cidadãos por força do princípio da proporcionalidade, que é notório entre
os juristas – logo, acreditamos que a Constituição exige uma proteção
eficiente também da população LGBT, o que demanda pela punição da homofobia
e da transfobia pelo Direito Penal na medida em que as leis administrativas
estaduais e municipais hoje existentes não têm se mostrado suficientes para
proteger as pessoas LGBT no Brasil mediante as penas (administrativas) que
impõem a tais condutas (como advertências, multas, suspensões e cassações de
licenças empresariais de funcionamento). Assim, entendemos que a própria
ideologia do Direito Penal Mínimo justifica a criminalização específica
da homofobia e da transfobia, pois temos aqui o que ela chama de bens
jurídicos relevantes (os citados direitos fundamentais à livre orientação
sexual, livre identidade de gênero, segurança e tolerância) e a ineficácia
dos demais ramos do Direito para
protegê-los.
Assim, a ABGLT tem a certeza de que está atuando a favor da democracia e
da cidadania em geral com esta demanda, pois, como se sabe, não se pode dizer
que o Estado respeita os direitos humanos enquanto uma pessoa ainda tiver seus
direitos humanos violados, como ainda lamentavelmente ocorre com a população
LGBT na atualidade.
Toni Reis (presidencia@abglt.org.br; celulares: 41 9602 8906
/ 61 8181 2196), presidente da ABGLT, e Carlos Magno, Secretário de Comunicação
da ABGLT (31 8817 1170) ficam à disposição para maiores esclarecimentos sobre os
aspectos políticos da ação – e Paulo Iotti, advogado que a elaborou e assinou,
fica igualmente à disposição para maiores esclarecimentos sobre os aspectos
jurídicos da mesma (pauloriv71@gadvs.com.br
***
Esclarecimentos do advogado Paulo Iotti:A ABGLT ingressou com mandado de injunção visando a criminalização específica da homofobia e da transfobia – trata-se do MI n.º 4733, no qual consto como advogado signatário da ação. No presente artigo, apresento um resumo dos fundamentos jurídicos da ação (que possui 88 páginas e cuja íntegra consta de link do segundo parágrafo deste escrito) e algumas explicações acerca dos mesmos e dos objetivos que eu e a ABGLT temos com tal iniciativa.
O mandado de injunção e o dever constitucional
do Congresso Nacional de Criminalizar a homofobia e a transfobia.
Fundamentos do mandado de injunção n.º 4733.
http://pauloriv71.wordpress.com/2012/06/26/mandado-de-injuncao-e-criminalizacao-de-condutas-o-mi-n-o-4733/
A ABGLT publicou nota informando que ingressou com mandado de
injunção perante o Supremo Tribunal Federal pleiteando o reconhecimento
do dever constitucional do Congresso Nacional em criminalizar a
homofobia e a transfobia. Como o advogado que assinou a ação em nome da
ABGLT e em razão da polêmica que a ação certamente trará, decidi
publicar este artigo explicitando os fundamentos
jurídico-constitucionais que justificam desde o cabimento do mandado de
injunção para criminalização de condutas quanto a procedência dos
pedidos dele constantes, em especial o de declaração da mora
inconstitucional do Congresso Nacional na referida criminalização.
Inicialmente, uma advertência e um pedido: a petição inicial possui
oitenta e oito páginas, razão pela qual o presente artigo constitui
apenas resume o que ali se expõe. Logo, a ética demanda que os críticos
primeiro leiam a íntegra da ação para, somente após compreenderem
integralmente suas razões, poderem tecer suas críticas. Como a íntegra
da ação não se encontra (pelo menos até o momento) disponível no site do
STF a quem não seja advogado(a) com procuração para atuar no caso,
segue link com a íntegra da mesma, na cópia fornecida pelo Tribunal em
seu site a quem atue, como advogado(a), no caso: https://skydrive.live.com/?sc=documents&cid=467b1ad1742ba27e#cid=467B1AD1742BA27E&id=467B1AD1742BA27E%21156&sc=documents
Inicialmente, analisemos o contexto social acerca da criminalização da homofobia e da transfobia.
Estamos vivendo em um contexto social de verdadeira banalidade do mal homofóbico, no qual homofóbicos chegam ao ponto de explodir uma bomba ao final da Parada LGBT de São Paulo, em um típico atentado terrorista de motivação homofóbica[1], no qual um padrasto mata filho de 14 anos por não aceitar sua orientação sexual[2],
no qual temos uma pessoa LGBT morta a cada dia e meio por sua mera
orientação sexual, consoante relatórios do Grupo Gay da Bahia[3],
sendo que até o Departamento de Estado dos Estados Unidos reconhece a
alta incidência da homofobia no Brasil com base nesses relatórios[4];
estamos vivendo em um país no qual temos recorde de pessoas pedindo
asilo no exterior pela homofobia generalizada de nosso país[5], no qual pai e filho abraçados são agredidos por confundidos com um casal homoafetivo[6] (“não se pode nem abraçar o filho”, disse o pai que teve a orelha decepada no ataque…), no qual jovem é agredido na Avenida Paulista/SP com uma lampadada por ter sido presumido como homossexual[7], no qual casais homoafetivos são agredidos[8] e discriminados[9]
em estabelecimentos comerciais pelo simples fato de manifestarem seu
afeto da mesma forma que fazem casais heteroafetivos… enfim, vivemos um
contexto social no qual temos crimes praticados por motivação
homofóbica/transfóbica ocorrendo rotineiramente sem que o Estado
Brasileiro tome medidas efetivas para combatê-los – medidas estas que,
embora não se limitem, se iniciam pela criminalização específica da
homofobia e da transfobia… A frase de um daqueles que pediu asilo no
estrangeiro é peremptória: “Não volto de jeito nenhum. Porque aí no Brasil eu serei pra sempre uma condição. Aqui, sou um ser humano” –
veja-se a quem ponto chegamos: um brasileiro homossexual dizer que não
volta ao Brasil porque aqui não é tratado como ser humano por conta de
sua homossexualidade… Sobre o tema, Maria Berenice Dias bem
afirmou que a não-criminalização da homofobia é a raiz de iniciativas
como essa por parte de brasileiros residentes fora, pois “A
homofobia pais é uma realidade social, e a ausência de uma legislação
que a criminalize, por si só, já justifica esses pedidos de asilo”, pois o pedido de asilo “É
medida necessária à medida em que se tem um número muito significativo
de violência sem qualquer tipo de repressão. E acho até bom que esses
asilos sejam concedidos, pois acabam até expondo o Brasil a um
constrangimento – porque o Judiciário avança em termos de reconhecimento
de direitos civis, mas na criminalização está difícil de avançar”[10].
Sobre o tema dos homicídios homofóbicos, segundo o Grupo Gay da Bahia
(GGB), único ente que mapeia os assassinatos cometidos por homofobia
ante a inércia do Estado Brasileiro em fazê-lo apesar disto constar como
dever estatal desde o Plano Nacional de Direitos Humanos n.º 2, de
2002, “99% desses homicídios têm relação com homofobia. Segundo o antropólogo [Luiz Mott],
há também uma ‘homofobia cultural, que expulsa as travestis para a
margem da sociedade, onde a violência é mais endêmica’ e uma ‘homofobia
institucional, quando o governo não garante a segurança dos espaços
frequentados pela comunidade LGBT’”[11]; destaca,
ainda, que, pelo número de assassinatos homofóbicos cometidos no
primeiro trimestre deste ano, 2012 tende a bater novo (nefasto) recorde
de assassinatos cometidos por motivação homofóbica[12]. Logo, absolutamente necessária específica da criminalização da homofobia e da transfobia na atualidade.
Contudo, a criminalização da homofobia e da transfobia é alvo de
feroz oposição pautada em falácias argumentativas e não na realidade,
como a de que o PLC n.º 122/06 visaria dar “privilégios” às
pessoas LGBT. Ora, tanto não se quer “privilégio” nenhum que o projeto
pede a equiparação da violência e da discriminação por orientação sexual
e por identidade de gênero àquelas cometidas em razão de cor, etnia,
procedência nacional e religião já previstas na Lei de Racismo (Lei n.º
7.716/89) – logo, os religiosos que se opõem a isso é que estão querendo
garantir “privilégios” a si (e negá-los a outros), pois se forem
agredidos e/ou ofendidos por sua opção religiosa, a conduta configura
crime de racismo, donde pessoas agredidas e/ou ofendidas por sua
orientação sexual e/ou identidade de gênero (que sequer são “opções” da
pessoa) devem ser protegidas (penalmente) da mesma forma. Por outro
lado, ao se querer criminalizar condutas motivadas na “orientação
sexual” e na “identidade de gênero” da vítima, heterossexuais também
estarão protegidos, donde se eventualmente ocorrer a tal “heterofobia”
tão alardeada (embora inexistente, já que não se tem notícia de
agressões, ofensas e/ou discriminações generalizadas motivadas na
heterossexualidade da pessoa), isso também configurará crime. Por fim, o
projeto não afronta a liberdade de expressão porque ela não protege
discursos de ódio, ofensas gratuitas e/ou incitações à violência, ao
preconceito e/ou à discriminação – a liberdade é o direito de se fazer o
que não prejudique terceiros, donde, como tais condutas prejudicam suas
vítimas, não são protegidas pela liberdade de expressão. Considerações
análogas já fez o STF quando disse que a liberdade de expressão não
garante um “direito” ao racismo e ao antissemitismo (STF, HC n.º
82.424/RS). Afinal, liberdade de expressão não é liberdade de opressão[13] – o uso da liberdade de expressão para ofender o outro configura, no máximo, abuso deste direito, o que não está protegido pela Constituição.
Por outro lado, entendo que a Constituição obriga o Congresso
Nacional a criminalizar a homofobia e a transfobia, na medida em que ela
o obriga a criminalizar o racismo (logo, todas as formas de racismo) e a punir discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais
(art. 5º, incs. XLI e XLII, da CF/88). Considerando que o STF afirmou
que racismo é toda ideologia que pregue a inferioridade de um grupo
relativamente a outro, independentemente de questões biológicas (HC
82.424/RS), tem-se que a homofobia e a transfobia são espécies do gênero
racismo, já que a homofobia e a transfobia são posturas heterossexistas
que tomam pessoas LGBT como supostamente “inferiores” a heterossexuais
que se identificam com seu próprio gênero (heterossexismo é a ideologia
que afirma ser a heterossexualidade a única sexualidade “aceitável” e/ou
superior às demais orientações sexuais e à identidade de gênero
não-coincidente com o sexo biológico da pessoa). Por outro lado, ainda
que assim não se entenda, é inegável que a homofobia e a transfobia são discriminações atentatórias às liberdades fundamentais
da livre orientação sexual e da livre identidade de gênero – e a
punição precisa ser criminal, já que leis estaduais e municipais que
preveem punições administrativas a atos homofóbicos e transfóbicos têm
se mostrado insuficientes a coibi-las – e o mesmo se diga das
previsões genéricas do Código Penal de 1940 (dizer que o Código Penal
seria “suficiente” para coibir a homofobia e a transfobia é o mesmo que
dizer que ele seria “suficiente” para coibir o racismo em geral, o que é
igualmente absurdo – crimes de ódio devem ser punidos com maior
gravidade que crimes que não sejam motivados no ódio/menosprezo pela
sensação de medo/pavor/intranquilidade social que causam a suas
vítimas). Logo, a proibição de proteção deficiente, inerente ao
princípio constitucional da proporcionalidade, demanda pela
criminalização da homofobia e da transfobia para que exista uma proteção eficiente às cidadãs e aos cidadãos LGBT de nosso país.
Sobre o tema do direito fundamental à segurança e respectivo dever
estatal de a garantir, o Ministro Gilmar Mendes, na ADI n.º 3.112/DF,
com base na jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão, afirmou
que cabe ao Estado um “dever de proibição (Verbotspflicht), consistente no dever de proibir uma determinada conduta”, um ”dever de segurança (Sicherheitspflicht), que impõe ao Estado o dever de proteger o indivíduo contra ataques de terceiros mediante adoção de medidas diversas” e um “dever de evitar riscos (Risikopflicht), que
autoriza o Estado a atuar com o objetivo de evitar riscos para o
cidadão em geral mediante adoção de medidas de proteção ou de prevenção
especialmente em relação ao desenvolvimento técnico ou tecnológico”, razão pela qual entendemos que o Estado Brasileiro encontra-se em mora inconstitucional na efetivação do dever de proibição da homofobia e da transfobia, para se proibir expressamente mediante punição criminal as ofensas
(individuais e coletivas), agressões e discriminações motivadas pela
orientação sexual e/ou identidade de gênero, real ou suposta, da vítima,
para assim efetivar o dever de garantia da segurança da população LGBT, para protegê-la das agressões, ameaças, ofensas e discriminações por elas sofridas na atualidade, e do dever de evitar riscos
de homofobia e transfobia mediante adoção de medidas de proteção ou de
prevenção para se combater as condutas homofóbicas e transfóbicas hoje
nefastamente disseminadas na sociedade brasileira.
Para desenvolvimentos sobre o conteúdo do princípio da proporcionalidade na acepção de proibição de proteção deficiente e sua incidência para caracterizar a proteção deficiente do Estado Brasileiro na proteção da população LGBT pela ausência de criminalização específica da homofobia e da transfobia e para corroborar o cabimento do mandado de injunção por força da noção de um garantismo penal positivo caracterizador do dever estatal de garantia da segurança da população em geral e, portanto, também da população LGBT, vide o item 3.1 da petição inicial, pp. 12-29.
Todavia, a insensibilidade do Congresso Nacional a tal compreensão
forçou a ABGLT a procurar o Poder Judiciário. Desde sua origem os
direitos e garantias fundamentais se destinam a proteger as minorias de
arbitrariedades das maiorias. Nesse sentido, a abusiva inércia do
Congresso tem gerado uma verdadeira opressão da minoria LGBT pela arbitrariedade da maioria
parlamentar que se recusa a efetivar esta absolutamente necessária e
obrigatória criminalização específica, por imposição constitucional e
internacional – haja vista Resoluções recentes da ONU (16/06/2011) e OEA
(de 25/05/2009) que demandam pela punição específica da homofobia e da
transfobia pelos Estados nacionais –, o que justifica a ativação da
jurisdição constitucional, em sua função contramajoritária, para demandar ao Congresso a criminalização específica das ofensas
(individuais e coletivas), dos homicídios, das ameaças, agressões e
discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de
gênero, real ou suposta, da vítima para garantir que não seja inviabilizada a cidadania e/ou não sejam inviabilizados os direitos fundamentais à segurança (proteção eficiente), à tolerância, à livre orientação sexual e à livre identidade de gênero.
Assim, por entender que há ordem constitucional de legislar criminalmente
(mandado de criminalização) que obriga o Congresso Nacional a
criminalizar a homofobia e a transfobia (art. 5º, inc. XLII ou,
subdiariamente, inc. XLI, da CF/88), entendo que o Congresso encontra-se
em mora inconstitucional, o que significa que ele já deveria ter aprovado lei efetivando tal criminalização e, como não o fez, encontra-se em mora (atraso), e tal mora é inconstitucional porque a Constituição o obriga a aprovar tal lei (não basta votar e rejeitar, é preciso aprovar e efetivamente criminalizar para que saia de sua mora). Tal é a conclusão lógica da teoria da Constituição Dirigente: como a Constituição obriga o Congresso a legislar, ele é obrigado
a criar a legislação em questão, pela decisão sobre a conveniência,
oportunidade e necessidade de tal legislação já ter sido tomada pelo
Constituinte.
Aqui é preciso um parênteses. Desde o início informei à ABGLT que
esse mandado de injunção provavelmente causará polêmica na comunidade
jurídica até mesmo no que tange ao seu cabimento, pois sempre se pensa apenas em garantia de direitos e
não em criminalização de condutas quando se pensa nesta ação
constitucional. Contudo, teorias só são válidas se condizentes com o
texto constitucional e o texto constitucional não diz que “só cabe
mandado de injunção para regulamentação de direitos subjetivos” ou algo
do gênero. Considerando que o artigo 5º, LXXI, da Constituição Federal
afirma que “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de
norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania”, temos como precisa a lição de
Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, para quem “O
monopólio do emprego da força pelo Estado e a necessidade de atuação dos
representantes populares para a conformação das leis penais, faz
destas, quando constitucionalmente obrigatórias, uma prerrogativa da cidadania. Se há uma ordem constitucional cujo adimplemento é endereçado aos representantes do povo, o controle da omissão não pode ser negado à cidadania, no sentido amplo que se encontra no artigo 1º, inciso II, da Constituição”[14].
Por outro lado, os elevadíssimos índices de violência, discriminação e
ofensas por motivo de homofobia e transfobia têm efetivamente inviabilizado os
direitos fundamentais à livre orientação sexual e à livre identidade de
gênero pelo medo constante das pessoas LGBT de serem agredidas,
ofendidas, discriminadas e mortas na atualidade. Assim, tanto pela
inviabilização de prerrogativas inerentes à cidadania quanto pela
inviabilização de direitos e liberdades constitucionais, plenamente
cabível o presente mandado de injunção, donde a noção intuitiva de que
“só cabe mandado de injunção para regulamentação de direitos
subjetivos” é refutada pelo texto constitucional.
Ainda sobre o cabimento do mandado de injunção para criminalização de
condutas quando essa criminalização seja necessária e
constitucionalmente obrigatória, embora sem tratar do tema do mandado de
injunção, entendo absolutamente pertinente a lição de Luciano Feldens[15] no sentido de que “Sob uma perspectiva filosófica, os deveres (estatais) de proteção revelam-se como consequência primária da atribuição ao Estado do monopólio da força em um ambiente social onde a autodefesa dos particulares é, em princípio, vedada; em contrapartida, o Estado, que reivindica esse poder, obriga-se a garantir a proteção contra agressões ou ameaças de terceiros. Nesse contexto, os deveres de proteção
apresentam-se como a versão atual da contraprestação imputada ao – e
assumida pelo – Estado em decorrência de um hipotético pacto de sujeição
a que aderem os homens no precípuo desiderato de resguardarem sua
liberdade e segurança no convívio social. A legitimidade do Estado, que
se origina dessa adesão mútua, apenas se perfaz nessa troca. Na síntese
de Alexy, a renúncia ao direito a uma efetiva
autoproteção condicionada pela transição da situação pré-estatal à
situação estatal apenas se justificaria racionalmente se o indivíduo em
troca desta renúncia, obtivesse uma efetiva proteção do Estado”,
posicionamento este que, a meu ver, reforça o cabimento do mandado de
injunção para criminalização específica de condutas quando isto seja
necessário que não sejam inviabilizados direitos fundamentais dos
cidadãos e/ou prerrogativas da cidadania dos mesmos.
Como se vê, a afirmação apriorística segundo a qual “só cabe mandado
de injunção para garantir direitos” significa, na linguagem de Heidegger
e Gadamer, uma descabida entificação do ser do
mandado de injunção apenas a algumas situações quando, de acordo com a
correta interpretação do texto constitucional, ele abarca outras
situações, como a criminalização de condutas (ao menos se adotada a corrente concretista geral
do mandado de injunção, infra explicitada). Reitere-se, teorias só são
válidas se condizentes com o texto constitucional – e o texto
constitucional não consagra a tese segundo a qual “só cabe mandado de
injunção para garantir direitos”. Essa é uma postura puramente
ideológica não-abarcada pelo Direito Constitucional Positivo.
De qualquer forma, justamente por antecipar a polêmica relativamente ao cabimento do mandado de injunção, formulei pedido de cisão do julgamento, para que seja suscitada uma questão de ordem
para que o Tribunal decida, inicialmente, se é cabível o mandado de
injunção para criminalização de condutas para que, no caso de uma
decisão favorável, decida posteriormente o mérito da ação.
Sobre as indagações que por vezes me fazem sobre o motivo de não se
ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão sobre
o tema, que não terá as polêmicas sobre o cabimento e,
portanto, certamente poderá ingressar no mérito do pedido de declaração
de mora inconstitucional, a resposta é singela: a ABGLT não tem
legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade. Caso
algum legitimado tenha esse interesse, terá nosso total apoio.
Contudo, obviamente entendo absolutamente cabível o mandado de injunção
aqui explicitado.
Por outro lado, certamente surgirão críticas fundadas nas diferenças
entre o mandado de injunção e a ADIn por Omissão. Contudo, embora parte
da doutrina entenda que deveriam as ações diferirem na abrangência da
decisão (individual no primeiro e geral e abstrata na segunda), entendo
que: (i) ambos podem ter decisões com a mesma
abrangência (geral e abstrata, pela corrente concretista geral do
mandado de injunção), pois a necessidade de prova do interesse de agir
para o primeiro configura uma diferença suficiente entre o MI e a ADInO
(tese do Ministro Gilmar Ferreira Mendes, consagrada pelo STF desde
sempre em sua jurisprudência sobre o mandado de injunção, cf. MI n.º
107, o qual não foi superado neste ponto pelos MI n.º 670, 708 e 712,
como mostra o voto do Ministro Gilmar Mendes, que explicita tal
circunstância); (ii) essa compreensão
configura uma exceção à regra segundo a qual o cidadão não teria
legitimidade para controle abstrato de normas, até porque essa exceção
tem uma abrangência bem restrita, a saber, a do controle abstrato da omissão
inconstitucional, além da necessidade de prova do interesse de agir
para que cidadãos e associações coletivas possam mover o mandado de
injunção com tal fim; (iii) inexiste proibição constitucional de tal exegese, donde juridicamente possível tal compreensão jurídico-constitucional[16]; (iv)
tem-se como irrazoável a exegese que permita a propositura de ações com
o mesmo objeto quando há outra [exegese] que permita uma melhor
racionalização dos trabalhos da Corte – pela afronta à isonomia oriunda
de regulamentações distintas para pedidos idênticos sobre objetos
idênticos formulados por pessoas diferentes, donde irrazoável a exegese
que pretenda a existência de inúmeros julgamentos distintos para o mesmo
fim - além do que, um mandado de injunção visando a criminalização
específica de condutas não tem como gerar uma “norma de caso concreto”
já que a criminalização supõe necessariamente previsões gerais e
abstratas válidas para todo o país. Logo, plenamente viável a
regulamentação geral e abstrata realizada (também) por mandado de
injunção e (não só) por ação direta de inconstitucionalidade por
omissão.
Para a pormenorizada demonstração do cabimento do mandado de injunção
aqui comentado por força do princípio da proporcionalidade na acepção
de proibição de proteção deficiente, vide a petição inicial, item 3 (pp.
12-29).
Continuemos.
A legitimidade ativa da ABGLT é evidente, pois tendo o STF
afirmado que se aplica ao mandado de injunção a legislação aplicável ao
mandado de segurança enquanto não for aprovada lei regulamentando aquele
(STF, MI n.º 107), a legitimidade da ABGLT para propor mandado de
segurança coletivo lhe garante legitimidade para propor mandado de
injunção coletivo. Até porque, sendo uma associação voltada à promoção
de direitos da população LGBT e a combater a homofobia e a transfobia,
totalmente caracterizada a pertinência temática exigida pelo STF para tanto, donde evidente o interesse de agir da ABGLT para tanto.
Assim, caracterizado o cabimento do mandado de injunção para
criminalização de condutas de acordo com o texto constitucional
(positivo) e caracterizada a legitimidade ativa da ABGLT, entendo por
inquestionavelmente procedente o pedido de declaração da obrigação do Congresso Nacional em criminalizar a homofobia e a transfobia,
já que elas se enquadram no conceito jurídico-constitucional de racismo
definido pelo STF no HC n.º 82.424/RS, donde caracterizada uma omissão inconstitucional parcial
na criminalização de todas as formas de racismo prevista pelo art. 5º,
inc. XLII, da CF/88 (especificamente quanto ao racismo homofóbico e
transfóbico). Subsidiariamente, caso assim (equivocadamente) não se
entenda, caracterizada então uma omissão inconstitucional parcial na criminalização de todas as formas de discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais prevista pelo art. 5º, XLI, da CF/88, na medida em que a homofobia e a transfobia inegavelmente se caracterizam como tal.
Aqui ingressamos nos pedidos efetivamente polêmicos, cabendo
ressaltar que a não-concordância com eles não impede a concordância com a
declaração da referida mora inconstitucional do Congresso Nacional na
criminalização da homofobia e da transfobia. Afinal, antes de
regulamentar a greve dos servidores públicos, o STF sempre afirmou que
não poderia criar tal regulamentação por força da teoria da separação dos poderes
(entendimento superado pelo citado julgamento dos MI n.º 670, 708 e
712), mas, apesar disso, declarava a mora inconstitucional do Congresso
Nacional na elaboração da legislação respectiva (cf., v.g., MI n.º 20). Continuemos.
Caso acolha as razões supra e reconheça a mora inconstitucional do Congresso Nacional, o STF pode fixar um prazo razoável para que o Congresso, constituído em mora (cientificado de seu atraso), crie a lei em questão. Na ação foi sugerido o prazo de um ano porque o tema já é discutido há onze anos no Congresso Nacional (em 2001 foi proposto o PL 5003/01, aprovado na Câmara dos Deputados no final de 2006, quando chegou ao Senado como PLC 122/06), donde o tema já se encontra maduro o bastante para a definição da forma de efetivação de tal criminalização específica.
Por outro lado, deve-se pensar em o que acontecerá caso o Congresso
Nacional, mesmo cientificado de sua mora inconstitucional, não
criminalize a homofobia e a transfobia. Nesse sentido, a ação possui um
pedido, embasado em forte doutrina, no sentido de que deve ser
reconhecida a responsabilidade civil do Estado em
indenizar as vítimas de homofobia e de transfobia enquanto não efetivar a
respectiva criminalização. Da mesma forma que o Estado é civilmente
responsável pelos prejuízos que leis declaradas inconstitucionais tragam
aos cidadãos, também é civilmente responsável pelos prejuízos causados
aos cidadãos por omissões inconstitucionais quando comprovado que estas
causem prejuízos a estes. Assim, pelo elevado índice de violência,
ofensas e discriminações contra pessoas LGBT por sua mera orientação
sexual ou identidade de gênero, temos caracterizado o dano a tal população. A omissão dolosa/culposa do Estado em criminalizar a homofobia e a transfobia resta caracterizada pelo contexto social de banalidade do mal homofóbico,
sendo que os demais ramos do Direito não têm se mostrado aptos a
proteger de maneira eficiente os bens jurídico-constitucionais da livre
orientação sexual, livre identidade de gênero, tolerância e segurança
(que são, todos, direitos fundamentais), que mostram que mesmo a teoria
do Direito Penal Mínimo demanda pela criminalização aqui pretendida. O nexo causal
encontra-se no fato de que a omissão inconstitucional do Congresso
Nacional em criminalizar a homofobia e a transfobia tem gerado uma
nefasta sensação a homofóbicos e transfóbicos em geral de que eles
teriam um pseudo “direito” de ofender, agredir, ameaçar e discriminar
pessoas LGBT unicamente por sua orientação sexual homoafetiva/biafetiva
e/ou identidade de gênero transgênera, o que inclusive demonstra que o
Estado Brasileiro encontra-se conivente com a homofobia e a transfobia que nefastamente assolam a sociedade, donde configurado também o nexo causal
entre a omissão do Estado na criminalização específica de tais condutas
e as ofensas, agressões, ameaças e/ou discriminações sofridas por tais
pessoas em razão de sua orientação sexual e/ou de sua identidade de
gênero. Ou seja, presentes inclusive todos os requisitos clássicos da
configuração da responsabilidade civil do Estado pela não-criminalização
específica das ofensas (individuais e coletivas), agressões, ameaças e
discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de
gênero da vítima. Para maiores desenvolvimentos sobre o tema, vide o
item 6.2.2 da petição inicial (pp. 80-83).
Ademais, ainda sobre as consequências de uma eventual inação do
Congresso Nacional mesmo após cientificado de sua mora inconstitucional,
cabe perquirir acerca da possibilidade de outras consequências de tal
inação (que não apenas a responsabilidade civil do Estado). Durante
dezenove anos (1988 a 2007), o STF afirmou que não poderia suprir a
omissão do Congresso quando servidores públicos civis pleiteavam, em
mandado de injunção, que o tribunal regulamentasse o artigo 37, inciso
VII, da Constituição, que, na visão do Tribunal, condiciona o exercício
desse direito à aprovação de uma lei que o regulamente – afinal, o
Tribunal classificar esse dispositivo constitucional como norma de eficácia limitada
significa que ele sempre entendeu que o direito nele garantido só
poderia ser exercido se uma lei viesse a regulamentar esse direito. São
irrelevantes aqui as críticas da doutrina contemporânea à classificação
de José Afonso da Silva e às bases teóricas que a sustentam: fato é que o
STF a adota e a adotou na interpretação deste dispositivo
constitucional. Portanto, nesses dezenove anos, o STF disse que a única
coisa que poderia fazer era declarar essa inércia inconstitucional do
Congresso (vide, por exemplo: STF, MI n.º 20). Contudo, em 2007, ele mudou de posição. Tendo constatado o desrespeito do Congresso Nacional às decisões que o cientificaram de seu dever
de aprovar a lei regulamentadora da greve do serviço público, o STF
efetivou a regulamentação da greve dos servidores públicos civis, adaptando
a lei de greve do serviço privado às peculiaridades do serviço público
(logo, não se trata de aplicação pura e simples da referida lei ao setor
público como equivocadamente se difunde), o que o Tribunal fez
(corretamente) sob o pressuposto de que as decisões da Corte são
obrigatórias e que o seu não-cumprimento pelo Congresso Nacional
justifica a regulamentação do tema pelo STF para que a Constituição não
seja descumprida (STF, MI n.º 670, 708 e 712).
Outrossim, o Tribunal não garantiu o direito no caso concreto,
ele elaborou normatização geral e abstrata aplicável a todo o
ordenamento jurídico. A própria certidão de julgamento atesta isso ao
afirmar que restaram “vencidos [...] os Senhores Ministros
Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que limitavam a
decisão à categoria representada pelo sindicato e estabeleciam condições
específicas para o exercício das paralisações”. Logo, o STF aplicou a corrente concretista geral
do mandado de injunção, que determina a elaboração de normatização
geral e abstrata pela decisão de procedência da ação por força do
princípio da isonomia (para garantir que todos na mesma situação tenham a
mesma normatização a si reconhecida sem a necessidade de ingressarem
com a ação) e não a corrente concretista individual, que defende a garantia do direito apenas ao caso concreto apresentado ao Tribunal. Essa a correta interpretação da decisão.
Continuemos.
Aqui ingressamos na tese mais polêmica deste mandado de injunção.
Interpretar o artigo 37, inciso VII, da Constituição Federal como norma de eficácia limitada
é o mesmo que dizer que ele significa que “não há exercício do direito
de greve no serviço público sem lei anterior que o defina”, o que é
rigorosamente o mesmo que dizer que “não há crime sem lei anterior que o
defina, nem pena sem prévia cominação legal”, como diz o artigo 5º,
inciso XXXIX, da Constituição Federal, donde se o STF (corretamente)
superou a exigência absoluta de lei formal aprovada pelo Parlamento para
regulamentar a greve dos servidores públicos civis para dar cumprimento
à respectiva ordem constitucional de legislar, também pode fazê-lo para
criminalizar condutas quando isto seja necessário para garantir o
cumprimento à respectiva ordem constitucional de criminalização quando o
Congresso Nacional não cumpre esta imposição constitucional.
Imagino que muitos do mundo jurídico contemporâneo não aceitarão o que aqui se propôs: exercício de função legislativa atípica pelo
STF para criminalização de condutas em sede de mandado de injunção nos
casos de ordens constitucionais (expressas) de legislar. Debato o tema
há aproximadamente três anos especificamente sobre os mandados de
criminalização e reações puramente emocionais são praticamente tudo o
que ouço como resposta. “Se o STF começar a tipificar crimes, estamos perdidos”, foi algo que ouvi certa vez; “você quer fechar o Congresso Nacional” [!??!],
foi o que ouvi (de forma levemente parafraseada) em outra oportunidade
(algo absurdo, pois obviamente sem menosprezar o fato de que o
Parlamento é o local mais adequado para aprovação de normas
gerais e abstratas, o fato é que se o Parlamento não cumpre seu dever
constitucional de legislar, alguém deve cumpri-lo se ele se recusa a
tanto apesar de cientificado pelo STF de sua mora inconstitucional…).
Sobre minha afirmação, de que o STF superou a exigência de lei formal
aprovada pelo Parlamento para regulamentar a greve dos servidores
públicos civis de sorte a dar cumprimento à respectiva ordem
constitucional de legislar, a resposta usual é “mas ele o fez para garantir direitos, não para criminalizar”, contudo, isso é irrelevante, pois exigência absoluta de lei é exigência absoluta de lei em qualquer caso, seja penal ou não-penal, e a interpretação do dispositivo sobre a greve dos servidores públicos civis como norma de eficácia limitada
é o mesmo que dizer que há uma exigência absoluta de lei aprovada pelo
Parlamento para que o referido direito constitucional possa ser
exercido. Logo, a regulamentação geral e abstrata da greve dos
servidores públicos civis feita pelo STF no julgamento dos MI n.º 670,
708 e 712 decorreu de exercício de atividade legislativa atípica
pelo Tribunal (donde, a menos que se comece a dizer que algumas
exigências absolutas de lei seriam “mais absolutas” que outras, descabe o
argumento aqui criticado).
O exercício de função legislativa atípica pelo Tribunal ocorre mesmo por intermédio da corrente concretista individual.
A procedência do mandado de injunção supõe necessariamente um dever
constitucional de legislar descumprido pelo Parlamento e demanda,
segundo as correntes concretistas (geral e/ou individual), a elaboração
da norma pelo Tribunal – e tal elaboração normativa é uma
atividade que a Constituição reservou ao Parlamento ao mesmo tempo em
que previu, segundo as correntes concretistas, que a inércia
inconstitucional do Parlamento em tal elaboração normativa supõe a
criação das normas jurídicas respectivas pelo Tribunal competente por
intermédio do mandado de injunção. Mesmo para a corrente concretista
individual, são tais razões que justificam, por exemplo, a decisão do
STF que decidiu que a mora do Congresso em legislar sobre a
aposentadoria especial de servidores públicos (art. 40, §4º, da
Constituição), dava ao Tribunal a prerrogativa não apenas declarar a
omissão, mas também “viabilizar, no caso concreto, o exercício desse direito, afastando as consequências da inércia do legislador” (Informativo do STF n.º 477).
De qualquer forma, sei/imagino que essa tese trará muita polêmica.
Eu, que a criei, sou o primeiro a isto reconhecer, embora (obviamente)
esteja convicto de seu acerto. Como visto, entendo que é inegável que a
homofobia e a transfobia configuram espécies do gênero racismo (ou, caso
equivocadamente assim não se entenda, no mínimo configuram
discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais), razão
pela qual tenho profunda convicção de que, se o STF julgar o mérito do
mandado de injunção, é absolutamente procedente o pedido de declaração
de mora inconstitucional do Congresso Nacional em criminalizar a
homofobia, ou seja, é absolutamente procedente o pedido de
cientificação do Congresso de que ele tem o dever constitucional de
criminalizar a homofobia e a transfobia. Acredito na procedência dos
demais pedidos, mas pela sua polêmica, cabe destacar a profunda
convicção na procedência, no mérito, do pedido de declaração da mora
inconstitucional do Congresso Nacional na criminalização específica da
homofobia e da transfobia.
De qualquer forma, entendo que as mesmas razões que justificaram o exercício de função legislativa atípica
pelo STF na regulamentação da greve dos servidores públicos civis
justifica essa mesma postura do STF para a criminalização da homofobia e
da transfobia caso o Congresso não a efetive após cientificado de sua
mora inconstitucional para tanto. Não cabe tergiversar: o STF exerceu função legislativa
naquela oportunidade (MI n.º 670, 708 e 712): o voto do Ministro Gilmar
Mendes isto reconheceu ao dizer que o Tribunal, ao evoluir em sua
jurisprudência pela saída da postura de meramente declarar a mora
inconstitucional do Congresso Nacional, o fez proferindo decisões
normativas, embora sem se comprometer a continuar exercendo uma função tipicamente legislativa (donde, a contrario sensu, reconhecendo que exercia função legislativa ou, no mínimo, normativa naquelas oportunidades), o Ministro Joaquim Barbosa foi peremptório sobre o tema ao dizer a frase “Já que decidimos legislar sobre o assunto, não seria melhor exaurir?”, o Ministro Sepúlveda Pertence também ao dizer que “Legislar é muito difícil”
e o Ministro Ayres Britto também ao dizer que a diferença entre o
Congresso e o Supremo no ponto é que o Supremo não pode deixar de
decidir [no contexto de decidir legislativamente, como
mencionado pelos outros ministros]. Logo, dê-se o nome que se quiser,
mas se reconheça que o STF exerceu atipicamente uma função legislativa
ao regulamentar a greve dos servidores públicos civis: os ministros
estavam plenamente cientes disto, como se vê pelos citados debates,
constantes desta histórica decisão. Para uma ampla exposição da
fundamentação da decisão do STF nesta decisão, vide o item 6.2.1 da
petição inicial (pp. 59-70).
Sobre a objeção relativa à separação dos poderes, no sentido de que o Judiciário não poderia exercer essa função legislativa atípica, tem-se que, estando o núcleo essencial do princípio da separação dos poderes no sistema de freios e contrapesos, no sentido de um poder
ter que controlar de maneira eficaz o outro para se coibir abusos, e
considerando a experiência brasileira (o contexto brasileiro) das
reiteradas intimações ao Congresso para sanar a omissão inconstitucional
na regulamentação da greve dos servidores públicos civis sem que ele
cumprisse sua obrigação constitucional de legislar, tem-se que a
única forma efetiva de se controlar a persistente omissão
inconstitucional do legislador é mediante a elaboração da normatização
geral e abstrata respectiva pela Suprema Corte ou pelo órgão por ela
designado por troca de sujeito.
Sobre o sistema de freios e contrapesos configurar o núcleo essencial da separação dos poderes, cabe lembrar que o próprio Montesquieu[17] já falava que “Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder”, frase esta que é a essência de sua compreensão acerca da necessidade de um sistema de separação dos poderes. “E
mesmo Montesquieu não entendia esta separação como um fim em si mesma,
mas como algo útil à sua concepção de separar para limitar”[18]. Como se vê, essa é a lógica do princípio da separação dos poderes, que vem desde Montesquieu no sentido do sistema de freios e contrapesos, no sentido de que um Poder
deve controlar eficazmente o outro para que não haja abusos – como o
abuso decorrente da reiterada inércia inconstitucional do Congresso
Nacional em cumprir ordens constitucionais de legislar (abuso porque, se
a normatização não for elaborada, a inércia inconstitucional estará
inviabilizando esta ordem constitucional de legislar). Logo, a despeito
da concepção concreta de separação de poderes de Montesquieu estar superada, pois o mesmo não aceitaria a diferenciação que hoje se faz entre norma e texto normativo no sentido daquela ser fruto da interpretação deste (pois, ao ver o juiz como mera boca que pronuncia as palavras da lei,
ele certamente não aceitaria essa participação ativa do intérprete na
criação da norma jurídica), pode-se afirmar que mesmo o seu conceito de separação dos poderes tem seu núcleo essencial no sistema de freios e contrapesos (sendo que a teoria tem sido melhor entendida como separação das funções do poder estatal,
visto que o Poder estatal é uno, sendo divisíveis as funções do Poder –
no caso, em função executiva, legislativa e judiciária. Mas se mantém
aqui o uso de “separação dos poderes” por se tratar de expressão consagrada).
Sobre a questão da troca de sujeito para o cumprimento da Constituição, é precisa a lição de Walter Claudius Rothenburg[19], segundo a qual “A ideia principal aqui desenvolvida é simples: importa
mais a finalidade de cumprir a Constituição, do que o sujeito (órgão) a
quem as atribuições (competências) foram conferidas.
Seria possível, portanto, admitir que outro sujeito, inicialmente não
dotado de atribuição constitucional, implementasse o comando
constitucional. O controle de constitucionalidade,
realizado por órgão e procedimentos legítimos, poderia chegar a esse
ponto: destituir um sujeito constitucionalmente previsto e autorizar
outro a dar efetividade à Constituição. [...] Deste
modo, por meio da fiscalização da omissão inconstitucional, pode-se
atingir o âmago do problema, que se situa antes no objeto do controle (o
desrespeito constitucional) do que no sujeito responsável. [...] Ora, o que importa fundamentalmente é suprir a lacuna inconstitucional, que constitui o objeto do controle.
A preocupação passa então novamente pelo sujeito, só que para
desinvestir o titular omisso e buscar outro capaz de colmatar a lacuna
indevida, realizando a tarefa constitucionalmente imposta. Agora, no
entanto, a questão do sujeito não aparece como principal (esta é a
efetivação do direito constitucional), apenas como meio de se obter
aquele resultado. A troca de sujeito apresenta-se,
assim, como um momento da evolução dos vínculos constitucionais e como
uma satisfação à exigência de implementação dos comandos constitucionais
(particularmente os vazados em termos programáticos). O órgão
encarregado do controle de constitucionalmente (principalmente o
Judiciário) tem-se apresentado como o mais adequado para conduzir (e às
vezes mesmo assumir) esse câmbio. Portanto, para dar
cumprimento satisfatório aos fins estabelecidos para o Estado (e a
sociedade), instaura-se uma polêmica concorrência de legitimidade entre,
fundamentalmente, o legislador (tradicional encarregado de emprestar
integração aos ditames constitucionais carentes de auto-executoriedade) e
o órgão judiciário incumbido de realizar a fiscalização de
constitucionalidade. [...] Já aqui se inicia o deslocamento de
competências constitucionalmente estabelecidas, com a vantagem –
marcante sob o aspecto prático – de que goza o Judiciário, de situar o
controle do descumprimento constitucional em um campo de mais fácil e
imediata aferição jurídica: a partir do instante em que o Judiciário
interfere na determinação do sujeito responsável pelo desempenho de
competências constitucionais, especifica-se uma ordem judicial, cujo desrespeito é de mais simples caracterização e punição”.
Embora a obra trabalhe fundamentalmente o tema das normas constitucionais garantidoras de direito usualmente tidas como programáticas/de eficácia limitada
(sem tratar, portanto, dos mandados de criminalização), entende-se aqui
que a fundamentação apresentada se aplica igualmente para as ordens
constitucionais de criminalização de condutas, que também tiram a
liberdade do legislador de decidir se irá ou não criar a lei criminal:
ele deve cria-la, por força da supremacia constitucional de um constitucionalismo dirigente
Como visto, ao regulamentar a greve dos servidores públicos civis, o
STF superou a exigência constitucional que entendeu existir no art. 37,
inc. VII, da CF/88, qualificada inclusive como exigência de reserva
legal absoluta (cf. STF, MI n.º 20, MI n.º 485, MI n.º 585 e MI n.º 631),
por conta da reiterada inércia inconstitucional do legislador em
cumprir seu dever constitucional de legislar a despeito de inúmeras
vezes cientificado de sua mora inconstitucional e de seu dever de
supri-la, para com isto evitar uma situação de menosprezo à supremacia
constitucional por conta da recusa do Parlamento em cumprir seu dever
constitucional de legislar.
Ora, se o Supremo Tribunal Federal superou a legalidade estrita
parlamentar (exigência constitucional absoluta de lei formal aprovada
pelo Parlamento) para regulamentar o exercício da greve no serviço
público para que pudesse ser dado cumprimento à vontade constitucional
de elaboração da legislação respectiva e assim garantir de maneira
efetiva a supremacia constitucional de um constitucionalismo dirigente,
tem-se que os mesmos fundamentos justificam que
o Supremo Tribunal Federal supere a legalidade estrita parlamentar
exigida constitucionalmente para criminalização de condutas de sorte a
efetivar a regulamentação normativa necessária à criminalização
específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente (mas não exclusivamente) das
ofensas (individuais e coletivas), dos homicídios, das agressões,
ameaças e discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou
identidade de gênero, real ou suposta, da vítima. Com efeito, afirmar que o art. 37, inc. VII, da CF/88 é uma norma de eficácia limitada é o mesmo que dizer que “não há exercício do direito de greve no serviço público sem lei anterior que o defina”, o que é rigorosamente o mesmo que dizer que “não há crime sem lei anterior que o defina”, como faz o art. 5º, inc. XXXIX, da CF/88, donde se
o STF (corretamente) superou a exigência de lei formal para garantir o
direito de greve do serviço público para dar cumprimento a ordem
constitucional de legislar, pode também fazê-lo para superar a exigência
de lei formal para efetivar a criminalização de condutas para dar
cumprimento a ordem constitucional de legislar criminalmente.
Afinal, as hipóteses normativas são rigorosamente as mesmas, por ambas
exigirem atuação necessária do legislador, donde se o dirigismo
constitucional oriundo das ordens constitucionais de legislar justifica a
superação da exigência de atuação do Parlamento para elaborar a
regulamentação respectiva em um caso, também o justifica no outro.
Como dito, sei que a tese aqui defendida certamente é polêmica, pois é óbvio que não ignoro que, a princípio, o art. 5º, inc. XXXIX, da CF/88, ao consagrar o princípio da legalidade estrita ou da reserva legal para fins criminais, pretendeu impor que as figuras típicas e suas sanções só possam ser criadas por leis do Parlamento e de acordo com o devido processo legal. Evidentemente não desconheço nem menosprezo a fundamentação acerca da alta relevância da exigência de legalidade estrita para fins de criminalização de condutas, como reação às criminalizações arbitrárias realizadas pelo Antigo Regime pré-revolução francesa mediante a imposição de que as leis sejam aprovadas pelo Parlamento, de sorte a garantir que o povo seja o responsável pela elaboração das normas gerais e abstratas que regerão a vida social e, especialmente, as leis restritivas de direitos, bem como visando a garantia de previsibilidade e ciência das pessoas sobre o que constitua crime (legalidade/taxatividade) – em suma, exigência de legalidade estrita nas criminalizações para se combater a ação arbitrária do Estado exemplificada pelos despotismos do absolutismo pré-revolução francesa e do nazi-fascimo. Contudo, em um Estado Democrático e Social de Direito dotado de supremacia constitucional sobre o Parlamento e pautado por um constitucionalismo dirigente que impõe ao Estado a obrigação de criar legislações criminais decorrentes de ordens constitucionais de legislar para efetivar o dever de proteção eficiente da população, a vontade constitucional é que a legislação seja efetivamente criada – este é o telos (a finalidade) inerente a tais ordens constitucionais de legislar, donde considerando que cabe ao Estado cumprir a Constituição, se o órgão estatal incumbido de elaborar a legislação (o Parlamento) se recusa a cumprir seu dever constitucional, o Estado deve efetivar a ordem constitucional, ainda que o faça por intermédio de outro de seus órgãos – no caso, o Judiciário, embora nada impeça que a Corte preferir determinar a troca de sujeito para o Executivo[20] elaborar a legislação faltante devido à inércia inconstitucional do Parlamento e, somente após eventual inércia também deste, atuar (a Corte) para elaborar a referida legislação. Afinal, “no Estado Constitucional Democrático de Direito, o poder público está obrigado, normativo-constitucionalmente, à adoção de todas as medidas necessárias à concretização das imposições constitucionais. Essa conclusão leva a uma outra: no Estado Constitucional Democrático de Direito, a proteção jurídica há de ser global e eficiente, sem lacunas, o que pressupõe, nos casos de omissão inconstitucional, o reconhecimento de um direito público subjetivo ao cidadão de exigir uma atuação positiva do legislador (inclusive um direito à legislação), e dos demais poderes do Estado”[21]. Essa lógica deve aplicar-se, igualmente, às ordens constitucionais de criminalização por isto ser necessário à concretização do dever estatal de proteção eficiente dos bens jurídicos que tais mandados de criminalização visam proteger e, inclusive, à noção de supremacia constitucional.
Afinal, se o Parlamento não cumpre seu dever constitucional de legislar, essa conduta afronta a norma constitucional caracterizadora do dever constitucional de legislar, criando uma tensão entre a ordem constitucional de legislar e a normatização constitucional que atribui a competência de elaborar a legislação ao Parlamento. Sobre o tema, entende-se aqui que essa tensão deve ser resolvida, por concordância prática, com
a fixação de um prazo razoável para o Parlamento suprir sua omissão
inconstitucional para que, ultrapassado este prazo sem o cumprimento de
tal encargo, a Corte elaborar a legislação/normatização geral e abstrata
respectiva. Afinal, na lição de Luiz Guilherme Marioni e Daniel Mitiero[22], “O
princípio da separação dos poderes confere ao Legislativo o poder de
elaborar as leis, mas, evidentemente, não lhe dá o poder de inviabilizar
a normatividade da Constituição. Aliás, tal poder certamente não é, nem
poderia ser, absoluto ou imune. Bem por isso,
nos casos em que a Constituição depende de lei ou tutela
infraconstitucional, a inação do Legislativo, exatamente por não ser
vista como discricionariedade ou manifestação de liberdade e sim
violação de dever, deve ser suprida pelo Judiciário mediante a
elaboração da norma que deixou de ser editada”, na medida em que o Legislativo não tem autorização para anular a Constituição, donde “não
há como compatibilizar o princípio da supremacia da Constituição com a
ideia de que esta pode vir a falhar em virtude da não atuação
legislativa”, razão pela qual “Quando
o Legislativo não atua, um Tribunal Supremo ou uma Corte Constitucional
tem inescondível dever de proteger a Constituição. Assim, se é a norma
legislativa que falta para dar efetividade à Constituição, cabe ao
Judiciário, sem qualquer dúvida, elaborá-la, evitando, assim, a
desintegração da ordem constitucional”.
A lição seria perfeita se os autores não afirmassem que haveria casos em que haveria necessidade de atuação indispensável
do legislador, da mesma forma que fazem Flavia Piovesan e Dirley da
Cunha Junior, que entendem que o STF pode normatizar o tema em casos de
reiterada mora inconstitucional do legislador (isso em ADIn por Omissão,
por interpretação teleológica do dispositivo constitucional
respectivo), salvo em determinadas hipóteses, como no Direito Penal.
Contudo, discordo dessa ressalva. O Direito Penal não está imune à lógica das ordens constitucionais de legislar,
donde se as ordens constitucionais de legislar justificam a elaboração
de norma geral e abstrata pelo STF para suprir a reiterada mora
inconstitucional do Congresso Nacional na elaboração de tal lei, essa
lógica se aplica a todas as ordens constitucionais de legislar. O Direito Penal não está imune à lógica constitucional,
logo, não está imune a esta lógica de concretização geral e abstrata da
ordem constitucional de legislar pelo STF – e, sobre o que já me foi
dito no sentido de que a noção de que “não há crime sem lei anterior que
o defina” encontra-se na Constituição tornaria injusta a acusação de
que os penalistas estariam a querer se blindar contra a Constituição,
cabe responder de que esse princípio dogmático já existia no Direito
Penal antes de sua constitucionalização, donde eles a ele se submetem
por ser condizente com a dogmática penal clássica. O simples fato de
existirem autores que absurdamente dizem que as ordens
constitucionais de criminalizar não seriam de obrigatório cumprimento
(!), mas apenas “autorizariam” a criminalização em tais hipóteses[23]
mostra que há muitos criminalistas que não aceitam a supremacia
constitucional quando ela não coincide com os dogmas penais (e falo isso
sem menosprezar a nobreza da intenção destes autores de impedir o
avanço desenfreado do Estado Penal para situações desnecessárias – mas
essa nobre intenção não afasta o fato de que, data venia,
menosprezam a supremacia constitucional quando ela não é condizente com
seus dogmas penais). Para a refutação desta tese, vide a petição
inicial, item 6.1.1 (pp. 55-59).
Ademais, cabe ressaltar que com a superação da legalidade estrita
criminal proposta na ação não se visa, de forma alguma, diminuir ou
menosprezar a limitação ao poder punitivo do Estado, que constitui a
origem histórico-teleológica da imposição de legalidade estrita para
fins criminais. De forma alguma. O fato é que é preciso distinguir situações em que esteja em jogo o cumprimento de ordens constitucionais de legislar descumpridas e situações nas quais não haja ordens constitucionais de legislar descumpridas. Quando temos uma ordem constitucional de legislar, o Parlamento tem o dever jurídico de legislar, não havendo “liberdade de conformação do legislador democrático” acerca da decisão de legislar ou não. Essa decisão já foi tomada pela Constituição – ele deve legislar, ele deve criar a lei, pois o juízo de conveniência,oportunidade e necessidade da lei já foi feito pelo Poder Constituinte,
não podendo o Parlamento simplesmente descumprir essa ordem provinda da
Constituição, pois o Parlamento encontra-se subordinado às
determinações do Poder Constituinte…
Situação distinta temos quando não há ordem constitucional de
legislar. Neste caso, há “liberdade de conformação do legislador
democrático”, que pode decidir pela necessidade, conveniência e
oportunidade na elaboração da legislação quando não tenhamos situação de
omissão inconstitucional. Nesse sentido, inexistindo omissão
inconstitucional do legislador no cumprimento de ordem constitucional de
criminalizar, a exigência de legalidade estrita para fins criminais é
absoluta e insuperável; por outro lado, existindo omissão
inconstitucional do legislador no cumprimento de ordem constitucional de
criminalizar, a exigência de legalidade estrita para fins criminais é
relativa e superável no caso de o Parlamento insistir na omissão a
despeito da declaração da mora inconstitucional pelo Tribunal
Constitucional (no caso, pelo Supremo Tribunal Federal) e da superação
do prazo razoável por ele fixado para a elaboração da legislação em
questão. Eis o princípio limitador da tese:
só é admissível a superação da exigência constitucional de legalidade
estrita parlamentar quando existir ordem constitucional de legislar
descumprida pelo legislador e quando o legislador permanecer inerte a
despeito da declaração da inconstitucionalidade desta omissão pelo
Tribunal Constitucional (no caso, o STF) e a despeito da superação do
prazo razoável por ele fixado para a elaboração da legislação em
questão. Pode-se limitar ainda mais a tese admitindo-se tal superação da
legalidade estrita apenas para ordens constitucionais expressas de criminalização, para fazê-lo apenas em hipóteses em que haja certeza absoluta
de que há tal dever constitucional de legislar, “certeza absoluta” esta
decorrente de texto constitucional expresso, afastando-se polêmicas
sobre a eventual existência de mandado de criminalização implícito
no caso concreto em julgamento (embora, no caso da ação aqui comentada,
tenhamos ordens constitucionais expressas – punição criminal do racismo
ou, subsidiariamente, a discriminações atentatórias a direitos e
liberdades fundamentais, respectivamente).
Para maiores desenvolvimentos sobre a superação da legalidade estrita criminal, vide a petição inicial, item 6.2.3 (72-80).
Assim, entendo plenamente justificada a presente ação em termos
técnico-jurídicos. Passemos, agora, a algumas considerações finais. Mas,
como dito no início, a ação possui oitenta e oito páginas e aqui as
suas teses foram resumidas, donde quem pretender criticá-las deve, por
ética e respeito, ler a íntegra da ação, na qual tais argumentos são
desenvolvidos de maneira mais pormenorizada.
Passemos, assim, às considerações finais.
Com essa ação, o que se pretende primordialmente é o
reconhecimento, pelo STF, de que o Congresso Nacional tem o dever
constitucional de criminalizar a homofobia e a transfobia de forma
específica, no sentido de que da mesma forma que as
criminalizações genéricas do Código Penal de 1940 não são suficientes
para coibir o racismo contra negros, não o são para coibir o racismo homofóbico e transfóbico
– da mesma forma, considerando que o Código Penal não é suficiente para
lidar com a violência contra as mulheres, há a Lei Maria da Penha,
donde deve haver uma punição criminal específica à homofobia e à
transfobia. Ou seja, o que eu e a ABGLT esperamos primordialmente é que o
Supremo Tribunal Federal reconheça o dever constitucional do Congresso
Nacional em criminalizar de forma específica a homofobia e a transfobia.
Se o STF julgar o mérito da ação, entendemos que a procedência desse
pedido é inquestionável. Embora também acreditemos na sua procedência,
reconhecemos que os demais pedidos provavelmente gerarão polêmica na
comunidade jurídica, mas este primeiro nos parece inquestionavelmente
procedente.
É importante destacar que a ABGLT não considera que o STF é a
panaceia para todos os males. Ela acredita nos fundamentos
constitucionais trabalhados na ação e, portanto, acredita que a nossa Constituição Cidadã de 1988 demanda pela proteção penal das cidadãs e dos cidadãos LGBT, já que a mesma proíbe a proteção deficiente de cidadãs e cidadãos por força do notório princípio da proporcionalidade – logo, acreditamos que a Constituição exige uma proteção eficiente
também da população LGBT, o que demanda pela punição da homofobia e da
transfobia pelo Direito Penal na medida em que as leis administrativas
estaduais e municipais hoje existentes não têm se mostrado suficientes
para proteger as pessoas LGBT no Brasil mediante as penas
(administrativas) que impõem a tais condutas (como advertências, multas,
suspensões e cassações de licenças empresariais de funcionamento).
Assim, entendemos que a própria ideologia do Direito Penal Mínimo justifica a criminalização específica da homofobia e da transfobia, pois temos aqui o que ela chama de bens jurídicos relevantes (os citados direitos fundamentais à livre orientação sexual, livre identidade de gênero, segurança e tolerância) e a ineficácia dos demais ramos do Direito
para protegê-los, dada a ineficiência das leis estaduais e municipais
de punições administrativas para tanto. Ora, se tal teoria diz que o
Direito Penal só pode ser usado se falham os demais ramos do Direito na
proteção dos bens jurídicos de alta relevância em questão, então, a contrario sensu, o Direito Penal deve ser utilizado em tal proteção por força da proibição de proteção deficiente decorrente do princípio da proporcionalidade.
Assim, a ABGLT tem a certeza de que está atuando a favor da
democracia e da cidadania em geral com esta demanda, pois, como se sabe,
não se pode dizer que o Estado respeita os direitos humanos enquanto
uma pessoa ainda tiver seus direitos humanos violados, como ainda
lamentavelmente ocorre com a população LGBT na atualidade. Eu, como
autor e advogado, tenho a mesma convicção, sendo esta a razão pela qual
concordou em patrocinar o presente mandado de injunção.
*Mestre em Direito Constitucional pela Instituição Toledo de Ensino/Bauru. Especialista em Direito Constitucional pela PUC/SP. Bacharel em Direito pelo Instituto Presbiteriano Mackenzie/SP. Advogado. Autor do Livro “Manual da Homoafetividade. Da Possibilidade Jurídica do Casamento Civil, da União Estável e da Adoção por Casais Homoafetivos. Co-autor dos Livros “Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo” (organizado por Maria Berenice Dias) e “Minorias Sexuais. Direitos e Preconceitos” (organizado por Tereza Rodrigues Vieira). Membro do GADvS – Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual.
[1] Cf., v.g., http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1194246-5605,00-EXPLOSAO+DE+BOMBA+CASEIRA+DEIXA+FERIDOS+NO+CENTRO+DE+SP+DIZ+POLICIA.html e http://antigo.andes.org.br/imprensa/ultimas/contatoview.asp?key=5906 (acesso em 03/05/12).
[2] Cf. http://imirante.globo.com/noticias/2012/04/26/pagina306726.shtml (acesso em 29/04/12).
[3] Cf. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1071307-assassinatos-de-homossexuais-batem-recorde-em-2011-diz-entidade.shtml (acesso em 29/4/12). Para um histórico dos relatórios do GGB e da homofobia no Brasil, vide MOTT, Luiz. Raízes Persistentes da Homofobia no Brasil. In: Minorias Sexuais. Direitos e Preconceitos, 1ª Ed., São Paulo: Ed. Consulex, 2012, pp. 165-182 (em especial: pp. 172-173).
[4] Cf.: para dados de 2010: http://www.state.gov/j/drl/rls/hrrpt/2010/wha/154496.htm; para dados de 2008: http://ipsnews.net/news.asp?idnews=46596 (todos: acesso em 09/05/12).
[5] Cf. http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/04/04/cresce-numero-de-brasileiros-gays-no-exterior-que-pedem-asilo-alegando-homofobia.htm e http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/04/04/nao-volto-de-jeito-nenhum-aqui-sou-um-ser-humano-nao-uma-condicao-desabafa-brasileiro-que-vive-no-canada.htm (acesso em 29/04/12).
[6] Cf. http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/07/nao-pode-nem-abracar-o-filho-diz-homem-que-teve-orelha-cortada.html (acesso em 29/04/12).
[7] Cf. http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2010/11/grupo-usou-lampadas-como-bastao-para-agredir-jovens-na-paulista.html (acesso em 29/04/12).
[8] Cf. http://acapa.virgula.uol.com.br/politica/casal-gay-agredido-se-soma-a-uma-serie-de-ataques-homofobicos-na-cidade-de-sao-paulo/2/5/14894 e http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/984492-casal-gay-e-agredido-na-regiao-da-av-paulista-em-sp.shtml?skin=folhaonline&comment=248332&reply=3795857&type=comment&done=http%3A%2F%2Fwww1.folha.uol.com.br%2Fcotidiano%2F984492-casal-gay-e-agredido-na-regiao- (acesso em 29/04/12).
[9] Cf. http://grupomatizespiaui.blogspot.com.br/2012/03/justica-condena-bar-por-discriminar.html (acesso em 29/04/12).
[10] Cf. http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/04/04/cresce-numero-de-brasileiros-gays-no-exterior-que-pedem-asilo-alegando-homofobia.htm (acesso em 29/04/12).
[11] Cf. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1071307-assassinatos-de-homossexuais-batem-recorde-em-2011-diz-entidade.shtml (acesso em 29/4/12).
[12] Idem.
[13] Frase constante de uma faixa levada à II Marcha Nacional contra a Homofobia, em Brasília, em 2012.
[14] GONÇALVES, Luiz Carlos dos Santos. Mandados Expressos de Criminalização e a Proteção de Direitos Fundamentais na Constituição Brasileira de 1988, 1ª Ed., Belo Horizonte: Editora Forum, 2007, pp. 299-300. G.n.
[15] FELDENS, Luciano. Direitos Fundamentais e Direito Penal. A Constituição Penal, 2ª Edição, Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2012, p. 87. G.n.
[16] Cf., v.g., STJ, MS n.º 14.050/DF, DJe de 21/05/2010; REsp n.º 782.601/RS, DJe de 15/12/2009; AR n.º 3.387/RS, DJe de 01/03/2010; MS n.º 13.17/DF, DJe de 29/06/2009; AgRg no REsp n.º 853.234/RJ, DJe de 19/12/2008; REsp n.º 820.475/RJ, DJe de 06/10/2008; AgRg no REsp n.º 863.073/RS, DJe de 24/03/2008; REsp n.º 797.387/MG, DJ de 16/08/2007, p. 289; MS n.º 11.513/DF, DJ de 07/05/2007, p. 274; RMS n.º 13.684/DF, DJ de 25/02/2002, p. 406; REsp n.º 220.983/SP, DJ de 25/09/2000, p. 72.
[17] MONTESQUIEU. O Espírito das Leis, Tradução de Edson Bini, 1a Ed., São Paulo: Editora Edipro, 2004, p. 189.
[18] PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Mandado de Injunção, 1a Ed., São Paulo: Editora Atlas, 1999, p. 107.
[19] ROTHENBURG, Op. Cit., pp. 13 e 90-91. G.n.
[20]
Claro que, aqui, não se aplicaria a vedação constitucional a medidas
provisórias em matéria criminal, pois a troca de sujeito em questão
visaria superar a inércia do Parlamento em cumprir a Constituição,
donde, como cabe ao Estado Brasileiro cumprir a Constituição,
se o Parlamento se recusa a fazê-lo, cabe ao Estado, de alguma forma,
cumprir o quanto determinado pela Constituição, seja por intermédio do Poder Executivo ou do Poder
Judiciário. Ainda que por interpretação restritiva, a vedação a MPs em
matéria criminal não pode abranger casos de cumprimento de imposições
constitucionais determinadas pela Suprema Corte, por troca de sujeito,
pois a ratio da proibição de MPs em matéria criminal não deve
incidir quando isto decorra do cumprimento de decisão da Suprema Corte
para cumprir ordem constitucional de legislar, pois esta legislação é
determinada pela Constituição. Ora, se o órgão ao qual a Constituição
obrigou a criar a legislação se recusa a cumprir a Constituição,
perfeitamente legítimo que a Suprema Corte, que tem o dever de extirpar a
situação inconstitucional do mundo jurídico, por troca de sujeito,
confira a si ou a outro órgão estatal o dever de cumprir a Constituição,
pois o mais importante é cumprir a Constituição, não quem a cumpre,
consoante a posição de Walter Claudius Rothenburg, exposta no corpo do
texto.
[21] JÚNIOR, Dirley da Cunha. Controle de Constitucionalidade, 2ª Ed., Salvador: Ed. Podvim, 2007, p. 224. G.n.
[22] SARLET, Ingo Wolfgang. MARIONI, Luiz Guilherme. MITIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional, 1ª Edição, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, pp. 1116-1118. G.n.
[23] Cf. PASCHOAL, Janaína Conceição. Constituição, criminalização e direito penal mínimo,
1ª Ed., São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 148; BIANCHINI,
Alice. MOLINA, Antonio García-Pablos. GOMES, Luiz Flávio. Direito Penal. Introdução e Princípios Fundamentais, 2ª Ed., São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2009, pp. 271-272; e COSTA, Leonardo Luiz de Figueiredo. Limites Constitucionais do Direito Penal, 1ª Ed., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2007, pp. 45-46.
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