quarta-feira, 28 de julho de 2010

DEPUTADOS E SENADORES SÃO CÚMPLICES PELA MATANÇA DE TRANSEXUAIS, TRAVESTIS, GAYS E LÉSBICAS NO BRASIL

Segue a macabra contabilidade de espancamentos, mutilações, humilhações, mortes.

Camilly, a trans militante da cidade de Campinas, SP, atacada a pauladas na madrugada de domingo, tendo o rosto desfigurado pelos golpes, teve declarada a sua morte cerebral, ontem, pelos médicos do Hospital Mário Gatti.

O criminoso, Roberto Rubens de Macedo, como sempre, alegou que ela tentara lhe forçar à prática de sexo - como se fosse possível!

Toda a militância de Campinas e São Paulo está indignada e pesarosa por mais este crime, praticado com a conivência por omissão dos senhores parlamentares federais, principalmente aqueles que professam a religião da intolerância, discriminação e segregação de quem é diferente deles.

No blog do Deco Ribeiro há um vídeo de Camilly, falando sobre a experiência de ser travesti.

Segundo os dados levantados pelo antropólogo Luís Mott, fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), e complementados pelo jornalista Deco Ribeiro, este ano de 2010, este é o

11º homicídio LGBT em São Paulo
a 38ª trans assassinada (33% de 112 mortes catalogadas)

São Paulo fica, assim, empatado com o Rio de Janeiro, com 11 mortes, ocupando ambos o 2º lugar nacional, atrás somente da Bahia, com 12.

Até o presente momento (desgraçadamente).
É preciso sempre destacar que tais números são subnotificados, dado que muitos não chegam até o conhecimento da imprensa, outros chegam, mas de forma a que não seja possível identificar o traço homofóbico. Outros, ainda, não chegam à contabilização que vem sendo realizada pelo antropólogo bahiano.
Graças à omissão e incúria criminosa de deputados federais e senadores, que insistem em misturar questões de crença religiosa e assuntos da vida civil, republicana, democrática.

Senhoras e senhores representantes do povo: vossas excelências ocupam um cargo de representação democrática, republicana; não estão a serviço de suas igrejas, para reimplantar um estado religioso.

Assuntos de crença religiosa devem ser circunscritos ao âmbito de suas igrejas, não em um parlamento republicano e democrático.

Misturar religião com a vida civil de uma nação tradicionalmente múltipla, diversa, formada por integrantes de todos os credos, etnias e culturas não é expressão democrática, mas tentativa de enfraquecer a laicidade do Estado republicano, conquistado a duras penas e ainda não inteiramente observado.

O nome do vosso Deus, que é amor, fraternidade, compreensão, não pode continuar a ser aviltado como vem fazendo vossas excelências.

Essas mortes, humilhações, dores, sofrimentos, haverão de lhes ser cobradas no Juízo Final!

***
Eis a carta de Loren Beauty, do E-Jovem e da Escola Jovem LGBT, de Campinas, em memória de Camilly:

Camily, Camily...

Ainda estávamos nos acostumando com seu novo nome, quando a vida nos prega esta peça... Sim, porque todo mundo a conhecia simplesmente como Cotonete, lembra? De quando você começou a se montar, magriiinha, parecia um cotonete mesmo (rsrs). Mas o sorrisão já te deixava linda como Cotonete, e mais ainda quando você se descobriu travesti e adotou Camily.

Bicha, acho que você era a única travesti de Campinas que era unanimidade. TODO MUNDO gostava de você. E tinha como não gostar de uma pessoa tão boa, que não fazia mal a um mosquito..?

Estou indignada e muito puta com o que aconteceu. E mais puta ainda com as injustiças que você sofreu mesmo depois de atacada. Injustiça dos policias que liberaram o assassino, mesmo ele tendo sido pego em flagrante tentando jogar você, desacordada, numa valeta.

Injustiça daquele projeto de jornal que escreveu uma matéria absurda sobre você, te chamando de homem o tempo todo e não questionando a versão mentirosa do assassino.

Injustiça dessa sociedade homofóbica que te empurrou para a marginalidade como faz diariamente com tantos meninos e meninas trans e depois os criticam quando são mortos, como borboletas, em situações de extrema vulnerabilidade e degradação. Você foi a 38ª trans assassinada este ano no Brasil. A 112ª LGBT. A 9ª LGBT assassinada este ano no Estado de São Paulo, que ocupa a 3ª colocação em números de mortes (só perde para a Bahia e pro Rio de Janeiro).

E o pior, Camily, é ficar aqui, com este sentimento de que não podemos fazer nada.

Ainda bem que podemos, sim. Podemos resgatar um pouco da justiça que você não teve. É o mínimo que acho digno. Eu como militante, drag queen e presidente de uma instituição, prometo que vou atrás disso com nossos colegas militantes e não vou sossegar até esse criminoso estar atrás das grades.

E não vou sossegar até que aquela área degrada do entorno da velha rodoviária seja revitalizada, para que a violência não nos ameace a todos que circulam na região. Como você, naquela noite fatídica.

Pode deixar que vamos olhar pela sua mãe. E o que a sua família precisar, estarei aqui.

Adeus, minha amiga Camily. Descanse em paz porque aqui nós vamos lutar para que esse crime não fique impune.

Lohren Beuty

***

Ainda ontem foi divulgada uma Nota Oficial da Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Secretaria Direitos Humanos da Presidência da República sobre a contumácia da violência praticada no Brasil contra travestis, transexuais, gays, lésbicas. O Blog do Deco Ribeiro publicou. Reproduzo aqui:

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

Secretaria de Direitos Humanos
Subsecretaria Nacional de Promoção de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos

NOTA PÚBLICA
Sobre a violência contra as travestis e transexuais no Brasil


A Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Secretaria Direitos Humanos da Presidência da República vem publicamente reafirmar seu compromisso no combate à violência e discriminação contra a população de travestis e transexuais do Brasil. Esses atos são conhecidos como transfobia.

Vítima desse tipo de violência, a jovem Camille Gerin, de 25 anos, foi agredida brutalmente a pauladas e morreu na tarde nesta terça-feira, em Campinas (SP). No estado de Mato Grosso, somente nos últimos trinta dias, oito travestis sofreram agressões físicas, entre elas a militante LGBT Lilith Prado.

Os crimes de ódio motivados pelo preconceito e discriminação com base na identidade de gênero são freqüentes e representam grave violação aos Direitos Humanos. Tal violência não tem justificativa nem é compatível com a democracia e a construção de uma sociedade mais justa e fraterna.

Esta Subsecretaria comprometida em acompanhar a apuração destes casos para que haja, nos termos e nos limites da lei, a efetiva responsabilização criminal de todos os envolvidos.


Brasília, 27 de julho de 2010


Lena Peres
Subsecretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos


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Um comentário:

Rita Colaço disse...

O corpo de Camilly foi sepultado hoje à tarde.