No blog do Deco Ribeiro há um vídeo de Camilly, falando sobre a experiência de ser travesti.
Segundo os dados levantados pelo antropólogo Luís Mott, fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), e complementados pelo jornalista Deco Ribeiro, este ano de 2010, este é o
a 38ª trans assassinada (33% de 112 mortes catalogadas)
São Paulo fica, assim, empatado com o Rio de Janeiro, com 11 mortes, ocupando ambos o 2º lugar nacional, atrás somente da Bahia, com 12.
Até o presente momento (desgraçadamente).
É preciso sempre destacar que tais números são subnotificados, dado que muitos não chegam até o conhecimento da imprensa, outros chegam, mas de forma a que não seja possível identificar o traço homofóbico. Outros, ainda, não chegam à contabilização que vem sendo realizada pelo antropólogo bahiano.
Graças à omissão e incúria criminosa de deputados federais e senadores, que insistem em misturar questões de crença religiosa e assuntos da vida civil, republicana, democrática.
Senhoras e senhores representantes do povo: vossas excelências ocupam um cargo de representação democrática, republicana; não estão a serviço de suas igrejas, para reimplantar um estado religioso.
Assuntos de crença religiosa devem ser circunscritos ao âmbito de suas igrejas, não em um parlamento republicano e democrático.
Misturar religião com a vida civil de uma nação tradicionalmente múltipla, diversa, formada por integrantes de todos os credos, etnias e culturas não é expressão democrática, mas tentativa de enfraquecer a laicidade do Estado republicano, conquistado a duras penas e ainda não inteiramente observado.
O nome do vosso Deus, que é amor, fraternidade, compreensão, não pode continuar a ser aviltado como vem fazendo vossas excelências.
Essas mortes, humilhações, dores, sofrimentos, haverão de lhes ser cobradas no Juízo Final!
***
Eis a carta de Loren Beauty, do E-Jovem e da Escola Jovem LGBT, de Campinas, em memória de Camilly:
***Camily, Camily...
Ainda estávamos nos acostumando com seu novo nome, quando a vida nos prega esta peça... Sim, porque todo mundo a conhecia simplesmente como Cotonete, lembra? De quando você começou a se montar, magriiinha, parecia um cotonete mesmo (rsrs). Mas o sorrisão já te deixava linda como Cotonete, e mais ainda quando você se descobriu travesti e adotou Camily.
Bicha, acho que você era a única travesti de Campinas que era unanimidade. TODO MUNDO gostava de você. E tinha como não gostar de uma pessoa tão boa, que não fazia mal a um mosquito..?
Estou indignada e muito puta com o que aconteceu. E mais puta ainda com as injustiças que você sofreu mesmo depois de atacada. Injustiça dos policias que liberaram o assassino, mesmo ele tendo sido pego em flagrante tentando jogar você, desacordada, numa valeta.
Injustiça daquele projeto de jornal que escreveu uma matéria absurda sobre você, te chamando de homem o tempo todo e não questionando a versão mentirosa do assassino.
Injustiça dessa sociedade homofóbica que te empurrou para a marginalidade como faz diariamente com tantos meninos e meninas trans e depois os criticam quando são mortos, como borboletas, em situações de extrema vulnerabilidade e degradação. Você foi a 38ª trans assassinada este ano no Brasil. A 112ª LGBT. A 9ª LGBT assassinada este ano no Estado de São Paulo, que ocupa a 3ª colocação em números de mortes (só perde para a Bahia e pro Rio de Janeiro).
E o pior, Camily, é ficar aqui, com este sentimento de que não podemos fazer nada.
Ainda bem que podemos, sim. Podemos resgatar um pouco da justiça que você não teve. É o mínimo que acho digno. Eu como militante, drag queen e presidente de uma instituição, prometo que vou atrás disso com nossos colegas militantes e não vou sossegar até esse criminoso estar atrás das grades.
E não vou sossegar até que aquela área degrada do entorno da velha rodoviária seja revitalizada, para que a violência não nos ameace a todos que circulam na região. Como você, naquela noite fatídica.
Pode deixar que vamos olhar pela sua mãe. E o que a sua família precisar, estarei aqui.
Adeus, minha amiga Camily. Descanse em paz porque aqui nós vamos lutar para que esse crime não fique impune.
Lohren Beuty
Ainda ontem foi divulgada uma Nota Oficial da Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Secretaria Direitos Humanos da Presidência da República sobre a contumácia da violência praticada no Brasil contra travestis, transexuais, gays, lésbicas. O Blog do Deco Ribeiro publicou. Reproduzo aqui:
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
Secretaria de Direitos Humanos
Subsecretaria Nacional de Promoção de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos
NOTA PÚBLICA
Sobre a violência contra as travestis e transexuais no Brasil
A Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Secretaria Direitos Humanos da Presidência da República vem publicamente reafirmar seu compromisso no combate à violência e discriminação contra a população de travestis e transexuais do Brasil. Esses atos são conhecidos como transfobia.
Vítima desse tipo de violência, a jovem Camille Gerin, de 25 anos, foi agredida brutalmente a pauladas e morreu na tarde nesta terça-feira, em Campinas (SP). No estado de Mato Grosso, somente nos últimos trinta dias, oito travestis sofreram agressões físicas, entre elas a militante LGBT Lilith Prado.
Os crimes de ódio motivados pelo preconceito e discriminação com base na identidade de gênero são freqüentes e representam grave violação aos Direitos Humanos. Tal violência não tem justificativa nem é compatível com a democracia e a construção de uma sociedade mais justa e fraterna.
Esta Subsecretaria comprometida em acompanhar a apuração destes casos para que haja, nos termos e nos limites da lei, a efetiva responsabilização criminal de todos os envolvidos.
Lena Peres
Subsecretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos
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Um comentário:
O corpo de Camilly foi sepultado hoje à tarde.
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